Vamos descansar um pouco, que o cemitério é longe.
190
Deitam o corpo, dentro da rede, no chão e sentam-se um pouco, enxugando o suor.
CHICÓ
Quando eu penso que pobre de João não tem nem direito a um enterro em latim! Coitado, está mais abandonado do que o cachorro do padeiro. Pobre de João!
JOÃO GRILO, erguendo a cabeça para fora da rede É, pobre de João agora, mas nesse instante vinha reclamando meu peso.
CHICÓ
Você ouviu alguma coisa?
PALHAÇO
Eu não.
CHICÓ
Pois eu ouvi direitinho a fala de João.
PALHAÇO
Ai, ai, ai, você já começa com suas histórias!
JOÃO GRILO, com voz de alma
Um Padre-Nosso e uma Ave-Maria para essa alma que aqui pena!
191
CHICÓ
Ai!
PALHAÇO
Ai! Chicó, me acuda que é a alma de João!
CHICÓ
Valha-me Nossa Senhora! João, pelo amor de Deus, se lembre de que fui seu amigo!
JOÃO GRILO, saltando fora da rede
Estou aqui, Chicó!
CHICÓ
Ai!
PALHAÇO
Ai! Corre Chicó!
CHICÓ
E eu posso? Acho que minhas pernas caíram!
PALHAÇO
Então vá-se danar, porque eu vou!
Sai correndo. Chicó ajoelha-se.
JOÃO GRILO, cruzando os braços
Tenha vergonha, Chicó! Um homem desse tamanho com medo de alma! Nem coragem para correr teve!
192
Ai meu Deus, é João! João, dizei-me o que quereis e se estais no céu, no inferno ou no purgatório!
JOÃO GRILO
Olhe a besteira dele! Fica logo com fala de alma: “João, dizei-me se estais não sei o quê!”