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E para isto fugiste tu ao lar paterno, meu pae!

E para isto abandonaste a mãe que te estremecia, e a irmã, que se finou, com saudades tuas!

E para isto foste ferido trez vezes em campanha, e alcançaste juz a essa medalha que tanto te ufanava, e que tão pouco vale aos olhos dos ignorantes, e dos preversos, que teem deixado crescer espinhos e abrolhos no campo formoso que tu e os teus companheiros d'armas arrotearam, para as futuras gerações gosarem!

Progresso! Liberdade! Tolerancia!

Termos mentidos! principios falsos! palavras sem significação, na pratica desgraçada de governos retrogrados, de ministros libertecidas, de homens que só respiram odios; e só aspiram vinganças!

O progresso para elles é a reacção!

A sua liberdade é a perseguição para os que mais livremente manifestam a sua opinião politica!

Para elles a tolerancia está nas cadeias em que encerram os adversarios ou aquelles que, fatigados dos seus desvarios, lançam mão do recurso extremo, do remedio fatal, da ultima rasão dos povos--a revolução; principio em nome do qual elles são poder; arma de que nenhum d'elles tem deixado de usar, no jogo abjecto d'essa politica miseravel, em que o paiz se tem arrastado ha mais de trinta annos!

Livre manifestação do pensamento!

Pois isto é por ventura principio pratico em Portugal?

Apregoam para ahi uns orgãos da imprensa, que é livre, liberrima, a manifestação do pensamento politico!

Mentira!

Poucos como eu podem mais desafogadamente responder a uma tal asserção:

--Mentira!

Poucos podem clamar, com mais documentado conhecimento da causa: Mentira!

Sim, mentira, porque no meu paiz não existe liberdade para a manifestação do pensamento, e eu sou d'isso um exemplo vivo!

Fallei uma vez ao povo, dizendo-lhe verdades que elle deve conhecer, e perseguiram-me!

Nunca foi alterada a ordem publica nas pacificas reuniões em que eccoou a minha voz, e processaram-me!

Exercia um direito que meu pae me conquistara com o seu sangue, e vi cair na valla humilde do cimiterio, minado de desgostos, louco de rancor, desesperado de arrependimento, o velho honrado que me deu o ser, ao ver-me perseguido e homisiado pelo crime horrendo de fallar em publico!

Mais tarde, por que reincidi n'este crime nefando, os miseraveis roubaram-me o emprego, exercido durante; muitos annos com honra e zello, no desempenho do qual só recebera elogios, e nunca censuras, ou mesmo leves admoestações!

E a manifestação do pensamento é livre, liberrima!

Na imprensa o mesmo!

Ainda bem a minha penna não tem traçado um periodo vehemente de amarga censura, ou de pungente ironia, contra os que cynicamente antepõem á lei a sua vontade pessoal, e já os escrivães e os juizes, os delegados e os esbirros da justiça andam atarefados em levantar processos, que partam os bicos d'esta penna, que se não dobra á venalidade, e que prefere ser molhada no fel amargo do calix da perseguição, do que nas amphoras douradas da corrupção, em que innutilisam as suas os jornalistas devassos!

E a manifestação do pensamento é livre, liberrima!

Restava-me ainda um recurso!

Descobri um outro campo em que podesse evangelisar a minha idéa querida, sem offensa das idéas de ninguem!

Era o theatro!

O theatro, onde na velha e sabia Grecia se fazia a apologia da virtude politica, e se erguia o patibulo moral dos homens publicos menos fieis aos seus deveres de cidadãos!

O theatro, d'onde nos tempos do governo absoluto se dirigia a satyra pungente e a ironia mordaz, contra os que menos presavam a dignidade nacional, e se tornavam reus de leso patriotismo!

Nem essa tribuna me póde ser franqueada; e não obstante eu não a busquei sem levar vestido o habito da decencia; não me preparei para ella sem o mais escrupuloso commedimento na phrase; eu não pensei em fazer do palco estatua de Pasquino, nem cruz ignominiosa de nenhum homem publico!

E apesar d'isso conheço que me é deffeso pôr em scena as figuras com que mais sympathiso no grande theatro da politica universal!

Vejo que me não será permittido evangelisar á luz civilisadora da rampa as theorias do meu credo politico, como se proclamam ali as theorias scientificas, como se apregoam as doutrinas philosophicas, como se apostolisam os principios humanitarios!

Como se a sciencia, a philosophia e a humanidade não tivessem intimas relações com a politica em geral!

E é livre, liberrima, a manifestação do pensamento!

Mentira! Falsidade! Embuste!

Vi para ahi na scena uma peças, aliás bem urdidas, e correctamente escriptas, em que se relatavam scenas, mais ou menos exactas, da guerra barbara que tem assolado a França!

E pensei:

--Pois se é permittida a representação de peças, em que os auctores se apresentam manifestamente inclinados á causa da França, o que até certo ponto prejudica a neutralidade do paiz em presença da guerra; por que não ha de alguem, no campo altissimo das generalidades, tratar em these os mais altos principios politicos?

Por essa occasião deu-se o tristissimo episodio da morte de Prim, que foi o fatal epilogo da revolução de Cadix, e o negro prologo da monarchia que o valente general ergueu sobre os destroços da monarchia bourbonica.

Na ignorancia dos pormenores d'aquella tragica scena, que não honra de certo os que a executaram; fervilharam os boatos a respeito da origem do crime.

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