Rebém que desconfiei do demo. Ali esse Treciziano era fraco de paciências; ou será que estivesse curtindo mais sede do que os
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João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas outros – segundo esse tremor das ventas – e pegou a malucar?
Diziam que ele criava dor-de-cabeça, e padecia de erupções e dartros. Estava falando contra comigo, reclamando, gritou uma ofensa. Homem zuretado, esbraseia os olhos. Eu, senhor de minhas inteligências, como fica dito. Eu estava podendo refletir, em passo de jumento. - “Siô, deixa o padre of recer missa...” –
falei para mim mesmo. Eu queria tolerar, primeiro: porque o demo não era homem para mandar em mim e me pôr em raiva.
Aí, era só eu forçar calma, tenteador; depois, com palavras de energia boa, eu acautelava evitando a jerimbamba, e daí repreendia esse Treciziano, revoltoso, próprio por autoridade minha, mas sem pau nem pedra. Que dessa – chefe eu – o O não me pilhava...
Mas – ah! – quem diga: um faz, mas não estipula. O que houve, que se deu. Que vi. Com a sede sofrida, um incha, padece nas vistas, chega fica cego. Mas vi. Foi num átimo. Como que por distraído: num dividido de minuto, a gente perde o tino por dez anos. Vi: ele – o chapéu que não quebrava bem, o punhal que sobressaía muito na cintura, o monho, o mudar das caras...
Ele era o demo, de mim diante... O Demo!... Fez uma careta, que sei que brilhava. Era o Demo, por escarnir, próprio pessoa!
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João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas E ele endireitou pontudo para sobre mim, jogou o cavalo...
O demo? Em mim, danou-se! Como vinha, terrível, naquele agredimento de boi bravo. Levantei nos estribos. - “E-hê!...”
Esse luzluziu a faca, afiafe, e urrou de ódio de enfiar e cravar, se debruçando, para diante todo. Tirou uma estocada. Cerrei com ele... A ponta daquela pegou, por um mau movimento, nas coisas e trens que eu tinha na cintura e a tiracol: se prendeu ali, um mero. Às asas que eu com a minha quicé, a lambe leal –
pajeuzeira – em dura mão, peguei por baixo o outro, encortei-recortei desde o princípio da nuca – ferro ringiu rodeando em ossos, deu o assovião esguichado, no se lesar o cano-do-ar, e mijou alto o sangue dele. Cortei por cima do adão... Ele Outro caiu do cavalo, já veio antes do chão com os olhos duros apagados... Morreu maldito, morreu com a goela roncando na garganta!
E o que olhei? Sangue na minha faca – bonito brilho, feito um verniz veludo... E ele: estava rente aos espinhos dum mandacaru-quadrado. Conforme tinha sido. Ah-oh! Aoh, mas ninguém não vê o demônio morto... O defunto, que estava ali, era mesmo o do Treciziano!
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João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas A morte dele deu certo. E era, segundo tinha de ser? E
tinha de ser, por tanto que o demo não existe! As tramóias, armadilhas... Nem nunca mais, daí por diante, eu queria pensar nele. Nem no pobre do Treciziano, que estava ali, degolal, que eu tinha... Um frio profundíssimo me tremeu. Sofri os pavores disso
– da mão da gente ser capaz de ato sem o pensamento ter tempo.
Somente todos me gabaram, com elogios e palavras prezáveis, porque a minha chefia era com presteza. Fosse de tiro, tanto não admiravam a tanto, porque a minha fama no gatilho já era a qual; à faca, eh, fiz! E do outro grupo, longe mas que era o mais perto, da banda da mão esquerda, um escutou ou viu, e veio. Era o Jiribibe, mocinho Jiribibe, num cavalo preto galopeiro. Diadorim tinha disparado tiro, só esmo; de nervosia.
Dentro de pouco, todos iam ficar cientes da proeza daquele homem tão morto: das beiras do corte – lá nele – a pele subia repuxada, a outra para baixo tinha descaído tamanhamente, quase nas maminhas até, deixavam formado o buraco medonho horrendo, se aparecendo a toda carnança. Aí Alaripe esclareceu: -
“Ao que sei, este era da Serra d’Umã...” O de tão longe, o sapo leiteiro! Uns estavam remexendo nele – não tinha um pêlo nos peitos. Assim queriam desaliviar aquele corpo, das coisas de valor
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João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas principais. Do que alguém disse que ele guardava: um dixe, joiazinha de prata; e as esporas eram as excelentes, de bom metal.
Não turveei. Morte daquele cabra era em ramo de suicídios-
“A modo que morreu? Ele foi para os infernos?”-indagou em verdade o menino Guirigó. Antes o que era que eu tinha com isso, como todos me louvaram? Sendo minha a culpa – a morte, isso sei; mas o senhor me diga, meussenhor: a horinha em que foi, a horinha? Como que o cego Borromeu garrou um fanhoso recitar, pelos terços e responsos. Medo de cego não é o medo real. Diadorim me olhava – eu estivesse para trás da lua. Só aí, revi o sangue. Aquele, em minha roupa, a plasta vermelha fétida.
Do sangue alheio que grosso me breava, mal me alimpei o queixo; eu, desgostoso de sangue, mas deixava, de sinal? Ah, não, pois ali me salteou o horror maior. Sangue... Sangue é a coisa para restar sempre em entranhas escondida, a espécie para nunca se ver. Será por isso também que imensa mais é a oculta glória de grandeza da hóstia de Deus no ouro do sacrário – toda alvíssima!
– e que mais venero, com meus joelhos no duro chão.
Por mais, o corpo ali ficava, para o ar do raso. Sumimos de lá, há-se que tocávamos, adiante. À viajadamente eu ia, desconversei meu espírito. Até às aleluias!
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João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas Que, como conto. Aquele Treciziano tinha redobrado destino de tristefim de louco. Pois nem bem três léguas andadas, daí depois, a gente saía do Liso, como que a ponto: dávamos com uma varzeazinha e um esporão da serra; chapadas, digo.
Apeei na terra cristã. Se estava no para ver esses campos crondeubais da Bahia.
Adiante vim para pedir gole d’água, todo pacífico, no rancho de um solteiro; esse deu informação de que, dez léguas em volta, o povoal ia existindo sem questão. Somente seguimos.
Dali antes, a gente tinha passado o Alto-Carinhanha – lá é que o Rei-Diabo pinta a cara de preto. Onde chegados na aproximação do lugar que se cobiçava. Dado dia e meio – descrevendo no rumo que certo achamos logo – se havia de ter a casa da raça do Hermógenes! Lei de que íamos dar lá, madrugando madrugada, pegando todos desprevenidos, em movível supetão. Pois o Hermógenes parava longe, em hora recruzando meus antigos rastros, estes rasgos ele não adivinhava. Aí era o meu contrabalanço. Ah! – choca mal, quem sai do ninho...
Ao que, por isso, não tardamos; não tivessem a primeira notícia da gente. Não se tomou nem um dia de fôlego. A trote e a chouto, vencemos uma grande noite – e demos lá, no luzir d’alva.
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João Guimarães Rosa - Grande Sertão: Veredas Abarcamos as condições do lugar, em cerco, entendidos uns com uns, por meio de avisos: que eram canto de acauã e assovio de macaco. Porque sempre eles deviam de ter alguns curimbabas na defesa: capangas e carabinas. Daí, só se esperou o listrar da primeira barra e a ponta da manhã estremecente. Segundo nosso uso. Demos fogo.
Digo franco: feio o acontecido, feio o narrado. Sei. Por via disso mesmo resumo; não gloso. No fim, o senhor me completa.
Mas, fazia tempo que não se dava combate, e o propor da gente era tribuzana, essas ferocidades assim.
A casa da fazenda – aquele reto claro caiado; mas era um casarão acabando o tope do morrete; enganando, até parecia torta. Varejamos o total a tiro. Aí, e o que se gritava!: azurradamente...
Aqueles que estavam lá eram homens ordinários –