“Deus não escuta uma maldição injusta, e aquele que a profere é culpado aos seus olhos. Como nós temos dois gênios opostos — o bem e o mal —, pode haver uma influência momentânea, até mesmo sobre a matéria. Mas essa influência só ocorre pela vontade de Deus, e como acréscimo de provação para aquele que a sofre. De resto, com mais frequência, amaldiçoa-se os maus e abençoa-se os bons. Jamais a bênção e a maldição podem desviar a Providência da senda da justiça; ela nunca fere o maldito senão quando ele é mau, e sua proteção nunca cobre senão aquele que a merece.”
275 – O Livro dos Espíritos
CAPÍTULO X
OCUPAÇÕES E MISSÕES
DOS ESPÍRITOS
558. Os Espíritos têm outra coisa a fazer além de seu melhoramento pessoal?
“Eles colaboram com a harmonia do Universo, executando as vontades de Deus, de quem eles são ministros. A vida espírita é uma ocupação contínua, mas que não tem nada de penosa como na Terra, porque não há a fadiga corporal nem as angústias das necessidades.”
559. Os Espíritos inferiores e imperfeitos também desempenham alguma função útil no Universo?
“Todos têm deveres a cumprir. O último dos pedreiros também não contribui para a construção do edifício tanto quanto o arquiteto?” (Ver a questão 540.)
560. Cada um dos Espíritos tem atributos especiais?
“Isso quer dizer que todos nós devemos habitar em toda parte e adquirir o conhecimento de todas as coisas presidindo sucessivamente em todos os pontos do Universo. Mas, como é dito no Eclesiastes50, há tempo para tudo.
Assim, tal Espírito cumpre hoje seu destino neste mundo, outro tal o cumprirá ou já o cumpriu em outra época, na terra, na água, no ar etc.”
561. As funções que os Espíritos desempenham na ordem das coisas são permanentes para cada um e estão nas atribuições exclusivas de certas 50 Eclesiastes: um dos livros do Antigo Testamento que compõem a Bíblia. — N. T.
276 – Allan Kardec
classes?
“Todos devem percorrer os diferentes graus da escala para se aperfeiçoarem. Deus — que é justo — não poderia querer dar a uns a ciência sem trabalho, enquanto outros só a adquirem com sacrifício.”
Da mesma maneira, entre os homens, ninguém chega ao supremo grau de habilidade numa arte qualquer sem ter adquirido os conhecimentos necessários na prática dos mínimos detalhes dessa arte.
562. Já não tendo mais nada a adquirir, os Espíritos da ordem mais elevada ficam num repouso absoluto, ou também têm ocupações?
“O que você pretenderia que eles fizessem por toda a eternidade? A ociosidade eterna seria um suplício perpétuo.”
562-a. — Qual é o tipo de ocupações dos Espíritos mais elevados?
“Receber diretamente as ordens de Deus, transmiti-las a todo o Universo e velar para que sejam executadas.”
563. As ocupações dos Espíritos são incessantes?
“Incessantes sim, se entendermos que o seu pensamento está sempre ativo, porque eles vivem pelo pensamento. Mas não devemos comparar as ocupações dos Espíritos com as ocupações materiais dos homens; essa mesma atividade é uma satisfação, pela consciência que eles têm de serem úteis.”
563-a. — Isso é concebível para aos bons Espíritos, mas o mesmo ocorre com os Espíritos inferiores?
“Os Espíritos inferiores têm ocupações apropriadas à sua natureza.
Por acaso se confia ao ajudante e ao ignorante os trabalhos do homem inteligente?”
564. Haverá entre os Espíritos os que fiquem ociosos, ou que não se ocupem de alguma coisa útil?
“Há, mas esse estado é temporário e subordinado ao desenvolvimento de suas inteligências. Certamente, assim como entre os homens, há Espíritos que
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só vivem para si mesmos. Todavia, essa ociosidade pesa sobre eles e, cedo ou tarde, o desejo de avançar lhes faz experimentar a necessidade da atividade e eles ficam felizes por poderem se tornar úteis. Estamos nos referindo aos Espíritos que chegaram ao ponto de terem consciência de si mesmos e do seu livre-arbítrio, pois em sua origem eles são como crianças que acabam de nascer e que agem mais por instinto do que por uma vontade determinada.”
565. Os Espíritos examinam nossos trabalhos de arte e se interessam por eles?
“Eles examinam o que pode provar a elevação dos Espíritos e seus progressos.”
566. Um Espírito que teve uma especialidade na Terra — pintor, ou arquiteto, por exemplo — se interessa de preferência pelos trabalhos que foram objeto de sua predileção durante a vida?
“Tudo se confunde num objetivo geral. Se for um Espírito bom, ele se interessará tanto quanto isso lhe permita se ocupar em ajudar as almas a se elevarem para Deus. Além disso, vocês esquecem que um Espírito que praticou uma arte na existência em que o conheceram pode ter praticado outra numa existência diferente, pois é preciso que ele saiba tudo para ser perfeito. Assim, conforme seu grau de adiantamento, pode não haver nenhuma especialidade para ele. Foi o que eu quis significar dizendo que tudo se confunde num objetivo geral. Notem ainda o seguinte: o que é sublime para vocês neste mundo atrasado não passa de infantilidade nos mundos mais adiantados. Como pretendem que os Espíritos que habitam esses mundos, onde existem artes desconhecidas para vocês, admirem o que, para eles, não vai além de uma obra de colegiais? Eu já disse: eles prestam atenção no que pode provar o progresso.”
566-a. — Imaginamos que deva ser assim para os Espíritos muito adiantados, mas nos referimos a Espíritos mais comuns e que ainda não se elevaram acima das ideias terrenas...
“Para esses, é diferente. Seu ponto de vista é mais reduzido e eles podem admirar o que vocês mesmos admiram.”
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567. Os Espíritos algumas vezes se envolvem em nossos ocupações e lazeres?
“Os Espíritos vulgares, como você diz, sim. Estes estão constantemente ao vosso redor e tomam parte — às vezes muito ativa — do que vocês fazem, conforme a natureza deles. E isso é necessário para impulsionar os homens pelas diversas veredas da vida, para excitar ou moderar suas paixões.”
Os Espíritos se ocupam das coisas deste mundo dependendo da sua elevação ou de sua inferioridade. Os Espíritos superiores indubitavelmente têm a faculdade de examiná-las nos mínimos detalhes, mas só o fazem na medida em que isso seja útil ao progresso; apenas os Espíritos inferiores dão a essas coisas uma importância relativa às reminiscências que ainda estão presentes na sua memória e às ideias materiais que ainda não foram apagadas.