"Unleash your creativity and unlock your potential with MsgBrains.Com - the innovative platform for nurturing your intellect." » » ,,O Primo Basílio'' - de Eça de Queirós

Add to favorite ,,O Primo Basílio'' - de Eça de Queirós

Select the language in which you want the text you are reading to be translated, then select the words you don't know with the cursor to get the translation above the selected word!




Go to page:
Text Size:

Luísa disse simplesmente:

Eu a ajudarei.

Tinha agora uma resignação muda, sombria, aceitava tudo!

Logo no fim da semana houve uma grande trouxa de roupa; e Juliana veio dizer que se a senhora passasse, ela engomava. Senão, não!

Estava um dia adorável; Luísa tencionava sair.. Pôs um roupão, e, sem uma palavra, foi buscar o ferro.

Joana ficou atónita.

Então a senhora vai engomar?

Há uma carga, e a Juliana só não pode aviar tudo, coitada!

Instalou-se no quarto dos engomados — e estava laboriosamente passando a roupa branca de Jorge, quando Juliana apareceu, de chapéu.

Você vai sair? — exclamou Luísa.

É o que eu vinha dizer à senhora. Não posso deixar de sair. — E

abotoava as luvas pretas.

Mas as camisas, quem as engoma?

Eu vou sair — disse a outra secamente.

Mas, com os diabos, quem engoma as camisas?

Engome-as a senhora! Olha a sarna!

Infame! gritou Luísa. Atirou o ferro para o chão, saiu impetuosamente.

Juliana sentiu-a ir pelo corredor aos soluços.

Pôs-se logo a tirar o chapéu e as luvas, assustada. Daí a um momento ouviu a cancela da rua bater com força. Veio ao quarto, viu o roupão de Luísa arremessado, a chapeleira tombada. Onde teria ido? Queixar-se à polícia?

Procurar o marido? Com os diabos! Fora estúpida, com o génio! Arrumou depressa o quarto; foi-se pôr a engomar, com o ouvido à escuta, muito arrependida. Onde diabo teria ido? Devia ter cuidado! Se a impelisse a fazer algum despropósito, quem perdia? Ela, que teria de sair da casa, deixar o seu quarto, os seus regalos, a sua posição! Safa!

Luísa saíra, como louca. Na Rua da Escola um cupê passava, vazio: atirou-se para dentro, deu ao cocheiro a morada de Leopoldina. Leopoldina devia ter voltado do Porto; queria vê-la, precisava dela, sem saber para quê.. Para desabafar! Pedir-lhe uma ideia, um meio de se vingar! Porque a vontade de se libertar daquela tirania — era agora menor que o desejo de se vingar daquelas humilhações. Vinham-lhe ideias insensatas! Se a envenenasse! Parecia-lhe que sentiria um prazer delicioso na ver torcer-se com vómitos dilacerantes, uivando de agonia, largando a alma!

Galgou as escadas de Leopoldina; a campainha ficou a retinir muito tempo do puxão da sua mão febril.

A Justina apenas a viu foi a gritar pelo corredor:

É a senhora D. Luísa, minha senhora, é a senhora D. Luísa!

E Leopoldina despenteada, com um roupão escarlate de grande cauda, correu estendendo os braços:

És tu! Que milagre é este? Eu levantei-me agora! Entra cá para o quarto. Está tudo desarranjado, mas não importa. Mas que é isto, que é isto?

Abriu as janelas que estavam ainda cerradas. Havia um forte cheiro de vinagre de toilete; a Justina tirava à pressa uma bacia de latão, com água ensaboada; toalhas sujas arrastavam; sobre uma jardineira tinham ficado da véspera os rolos de cabelos, o colete, uma chávena com um fundo de chá cheio de pontas de cigarros. E Leopoldina corria o transparente, dizendo:

Ora graças a Deus que honras esta casa, minha fidalga!. .

Mas vendo o rosto perturbado de Luísa, os seus olhos vermelhos de lágrimas:

Que é? Que tens tu? Que sucedeu?

Um horror, Leopoldina! — exclamou, apertando as mãos. A outra foi fechar a porta, rapidamente.

Então?

Mas Luísa chorava sem responder. Leopoldina olhava-a petrificada.

Are sens