—
Vou fazê-lo — disse Basílio erguendo-se, muito decidido.
—
E partimos amanhã? — gritou Reinaldo.
—
Amanhã.
—
Por Madrid?
—
Por Madrid.
—
Salero! — Pôs-se de pé na tina, entusiasmado, a escorrer, e com movimentos aduncos de magricela saltou para fora, embrulhou-se no roupão turco. O seu criado William entrou logo, sutilmente, ajoelhou-se, tomou-lhe
um pé entre as mãos, secou-lho com precauções, pôs-se respeitosamente a calçar-lhe a meia de seda preta com ferradurinhas bordadas.
Na manhã seguinte, um pouco antes do meio-dia, Joana veio bater discretamente à porta do quarto de Luísa, e com a voz baixa — desde o desmaio falava-lhe sempre baixo, como a uma convalescente:
—
Está ali o primo da senhora.
Luísa ficou surpreendida. Estava ainda de robe de chambre, e tinha os olhos vermelhos de chorar; pôs num instante um pouco de pó-de-arroz, alisou o cabelo, entrou na sala.
Basílio, vestido de claro, sentara-se melancolicamente no mocho do piano.
Trazia um ar grave, e, sem transição, começou a dizer: — que apesar de ela se ter zangado na véspera, ele considerava ainda tudo "como dantes". Viera porque naquele momento não se podiam separar sem algumas explicações, sobretudo sem resolver definitivamente o caso da carta. . E com um gesto triste, como contendo lágrimas:
—
Porque eu vejo-me forçado a sair de Lisboa, minha querida!
Luísa, sem olhar para ele, fez um sorriso mudo, muito desdenhoso. Basílio acrescentou logo:
—
Por pouco tempo, naturalmente; três semanas ou um mês. . Mas enfim tenho de partir. . Se fossem só os meus interesses! — Encolheu os ombros
com desdém. — Mas são interesses de outros... E aqui está o que eu recebi está manhã.
Estendeu-lhe um telegrama. Ela conservou-o um momento, sem o abrir; a sua mão fazia tremer o papel.
—
Lê, peço-te que leias!
—
Para quê? — fez ela.
Mas leu baixo: "Venha, graves complicações. Presença absolutamente necessária. Parta já".
Dobrou o papel, entregou-lho.
—
E partes, hem?
—
É forçoso.
—
Quando?
—
Esta noite.