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Ora! São génios! Gosta de arrumar. Ah, lá isso deve-se dizer, é senhora de muita ordem. Mas gosta, gosta de trabalhar. Às vezes basta-lhe ver um bocadinho de pó, agarra logo no espanador. . É génio. Tenho visto outras assim.. E punha a cabeça de lado franzindo os beiços.

O que ela é, é uma santa — repetiu Joana.

É génio! Está sempre numa labutação. Eu nunca saio sem deixar tudo brinco. Pois senhores, nunca está satisfeita. Até noutro dia, lá embaixo a passar a roupa. . Eu ia a sair, pois tirei logo o chapéu, e não consenti. . Olhe, quer diga? Falta de cuidados, não ter filhos. . Que ela não lhe falta nada...

Calou-se, remirou o pé, e com satisfação:

Nem a mim — disse reclinando-se na cadeira. Joana pôs-se a cantarolar. Não queria questões. Mas ultimamente achava tudo aquilo muito fora dos eixos, a Juliana sempre na rua, ou metida no quarto a trabalhar para si, sem se importar, deixando tudo ao deus-dará, e a pobre senhora a varrer, a passar, a emagrecer! Não, ali havia coisa! Mas o seu Pedro que ela consultara, disse-lhe com finura, retorcendo o buço: — Elas lá se entendem! Trata tu de gozar, e não te importes com a vida dos outros. A casa é boa, toca a tirar partido!

Mas Joana sentia "lá por dentro" a crescer-lhe uma embirração pela Sra.

Juliana. Tinha-lhe asca pelas tafularias, pelos luxos do quarto, pelas passeatas todo o dia, pelos modos de madama; não se recusava a fazer-lhe o serviço, porque isso lhe rendia presentinhos da senhora; mas quê, tinha-lhe birra! O

que a consolava era a ideia de que um piparote desfazia aquela magricela! E ia tirando partido da casa também. O Pedro tinha razão. .

Juliana com efeito, agora, não se constrangia. Depois da cena da roupa assustara-se, porque, enfim, o escândalo podia-lhe fazer perder a posição; durante alguns dias não saiu, foi cuidadosa; mas quando viu Luísa resignar-se, abandonou-se logo, quase com fervor, às satisfações da preguiça e às alegriazinhas da vizinhança. Passeava, costurava fechada no seu quarto, e a Piorrinha que se arranjasse! Diante de Jorge ainda se continha: temia-o. Mas apenas ele saía! Que desforra! Às vezes estava varrendo ou arrumando — e,

mal o sentia fechar a cancela, atirava o ferro, a vassoura, punha-se a panriar.

Lá estava a Piorrinha, para acabar!

Luísa, no entanto, passava pior: tinha de repente, sem razão, febres efémeras; emagrecia, e as suas melancolias torturavam Jorge.

Ela explicava tudo pelo nervoso.

Que será, Sebastião? — era a pergunta incessante de Jorge. E lembrava-se com terror que a mãe de Luísa morrera de uma doença de coração!

Na rua, pela cozinheira, pela tia Joana, sabia-se que a do Engenheiro ia mal. A tia Joana jurava que era a solitária. Porque enfim, uma pessoa a quem não faltava nada, com um marido que era um anjo, uma boa casa, todos os seus cómodos — e a esmorecer, a esmorecer.. Era a bicha! Não podia ser senão a bicha! E todos os dias lembrava a Sebastião que se devia mandar chamar o homem de Vila Nova de Famalicão, que tinha o remédio para a bicha.

O Paula explicava de outro modo:

Ali anda coisa de cabeça — dizia, franzindo a testa, com o ar profundo.

Sabe o que ela tem, Sra. Helena? É muita dose de novelas naquela cachimónia. Eu vejo-a de pela manhã até à noite de livro na mão. Põe-se a ler romances e mais romances... Aí têm o resultado: arrasada!

Um dia Luísa de repente, sem razão, desmaiou; e quando voltou a si ficou muito fraca, com o pulso sumido, os olhos cavados. Jorge foi logo buscar

Julião; encontrou-o muito agitado, porque o concurso era para o dia seguinte, e sentia cólicas.

Durante todo o caminho não deixou de falar excitadamente da sua tese, do escândalo dos patrocinatos, do barulho que faria se fossem injustos —

arrependido agora de não ter metido mais cunhas!

Depois de ter examinado Luísa veio dizer, furioso, a Jorge:

Não tem nada! E vais-me buscar para isto! Tem anemia, o que todos temos. Que passeie, que se distraia. Distrações e ferro, muito ferro. . E água fria, fria pra cima daquela espinha!

Como eram cinco horas convidou-se para jantar, deblaterando toda a tarde contra o país, amaldiçoando a carreira médica, injuriando o seu concorrente e fumando com desespero os charutos de Jorge.

Luísa tomava o ferro, mas recusava as distrações; fatigava-a vestir-se, aborrecia-lhe ir ao teatro. . Depois, logo que viu Jorge preocupar-se do seu estado, quis

afetar força, alegria, bom humor; e aquele esforço abatia-a, extraordinariamente.

Vamos para o campo, queres tu? — dizia-lhe Jorge desolado vendo-a esmorecida.

Ela, receando complicações possíveis, não aceitava; não se sentia bastante forte, dizia: onde estava mais confortável que em casa? Depois as despesas, os incómodos.

Uma manhã, que Jorge voltara a casa inesperadamente, encontrou-a em de chambre, com um lenço amarrado na cabeça, varrendo lugubremente. Ficou à porta, atónito:

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