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Que tens tu? Tu tens alguma coisa. Estranho-te tanto há dias! Não és o mesmo! Às vezes estás com um cara de réu... Que é? Diz.

E os seus olhos procuravam os dele, que se desviavam perturbados.

Abraçou-o. Insistia, queria que dissesse tudo à "sua mulherzinha".

Diz. Que tens?

Ele olhou-a muito, e de repente, com uma resolução violenta:

Pois bem, digo-te. Tu agora estás boa, podes ouvir.. Luísa! Vivo num inferno há duas semanas. Não posso mais. . Tu estás boa, não é verdade? Pois bem, que quer dizer isto? Diz a verdade!

E estendeu-lhe a carta de Basílio.

O que é? — fez ela muito branca. E o papel dobrado tremia-lhe na mão.

Abriu-a devagar, viu a letra de Basílio, num relance adivinhou-a. Fixou Jorge um momento de um modo desvairado, estendeu os braços sem poder falar, levou as mãos à cabeça com um gesto ansioso como se se sentisse ferida, e oscilando, com um grito rouco, caiu sobre os joelhos, ficou estirada no tapete.

Jorge gritou. As criadas acudiram. Estenderam-na na cama. Ele quis que Joana corresse a chamar Sebastião; e ficou, como petrificado, junto ao leito,

olhando-a, enquanto Mariana toda trémula desatacava os espartilhos da senhora.

Sebastião veio logo. Felizmente havia éter, fizeram-lho respirar; apenas abriu lentamente os olhos, Jorge precipitou-se sobre ela:

Luísa, ouve, fala! Não, não tem dúvida. Mas fala. Diz, que tens?

Ao ouvir a voz dele desmaiou outra vez. Movimentos convulsivos sacudiam-lhe o corpo. Sebastião correu a buscar Julião.

Luísa parecia adormecida agora, imóvel, branca como cera, as mãos pousadas sobre a colcha; e duas lágrimas corriam-lhe devagar pelas faces.

Um trem parou, Julião apareceu esbaforido.

Achou-se mal de repente. . Vê, Julião. Está muito mal! — disse Jorge.

Fizeram-lhe respirar mais éter; despertou outra vez. Julião falou-lhe, tomando-lhe o pulso.

Não, não, ninguém! — murmurou ela retirando a mão. Repetiu com impaciência: — Não, vão-se, não quero. . — As suas lágrimas redobravam. E

como eles saiam da alcova para a não excitar contrariando-a, ouviram-na chamar:

Jorge!

Ele ajoelhou-se ao pé da cama, e falando-lhe junto do rosto:

Que tens tu? Não se fala mais em tal. Acabou-se. Não estejas doente.

Juro-te, amo-te.. Fosse o que fosse, não me importa. Não quero saber, não.

E como ela ia falar, ele pousou-lhe a mão na boca:

Não, não quero ouvir. Quero que estejas boa, que não sofras! Diz que estas boa! Que tens? Vamos amanhã para o campo, e esquece-se tudo. Foi uma coisa que passou..

Ela disse apenas com a voz sumida:

Oh! Jorge! Jorge!

Bem sei.. Mas agora vais ser feliz outra vez.. Diz, que sentes?

Aqui — disse ela, e levava as mãos à cabeça. — Dói-me!

Ele ergueu-se para chamar Julião, mas ela reteve-o, atraiu-o; e devorando-o com os olhos onde a febre se acendia, adiantando o rosto, estendia-lhe os lábios. Ele deu-lhe um beijo inteiro, sincero, cheio de perdão.

Oh, minha pobre cabeça! — gritou ela.

As fontes latejavam-lhe, e uma cor ardente, seca, esbraseava-lhe o rosto.

Como era habituada a enxaquecas, Julião tranquilizou-os; recomendou um sossego imóvel e sinapismos de mostarda aos pés — até que ele voltasse.

Jorge ficou junto do leito, taciturno, cortado de pressentimentos, de sustos, suspirando às vezes.

Eram então quatro horas; caía uma chuva miudinha, enevoada; a alcova tinha uma luz lúgubre.

— Não há de ser nada. . — dizia Sebastião.

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