—
Não. Hás de ouvir. Desde o primeiro dia que te tornei a ver estou doido por ti, como dantes, a mesma coisa. Nunca deixei de me morrer por ti.
Mas não tinha fortuna, tu bem o sabes, e queria-te ver rica, feliz. Não te podia levar para o Brasil. Era matar-te, meu amor! Tu imaginas lá o que aquilo é! Foi por isso que te escrevi aquela carta, mas o que eu sofri, as lágrimas que chorei!
Luísa escutava-o imóvel, a cabeça baixa, o olhar esquecido; aquela voz quente e forte, de que recebia o bafo amoroso, dominava-a, vencia-a; as mãos de Basílio penetravam com o seu calor febril a substância das suas; e, tomada de uma lassidão, sentia-se como adormecer.
—
Fala, responde! — disse ele ansiosamente, sacudindo-lhe as mãos, procurando o seu olhar avidamente.
—
Que queres que te diga? — murmurou ela.
A sua voz tinha um tom abstrato, mal acordado.
E desprendendo-se devagar, voltando o rosto:
—
Falemos noutras coisas!
Ele balbuciava com os braços estendidos:
—
Luísa! Luísa!
—
Não, Basílio, não!
E na sua voz havia o arrastado de uma lamentação, com a moleza de uma carícia.
Ele então não hesitou, prendeu-a nos braços.
Luísa ficou inerte, os beiços brancos, os olhos cerrados — e Basílio, pousando-lhe a mão sobre a testa, inclinou-lhe a cabeça para trás, beijou-lhe as pálpebras devagar, a face, os lábios depois muito profundamente; os beiços dela entreabriram-se; os seus joelhos dobraram-se.
Mas de repente todo o seu corpo se endireitou, com um pudor indignado, afastou o rosto, exclamou aflita:
—
Deixa-me, deixa-me!
Viera-lhe uma força nervosa; desprendeu-se, empurrou-o; e passando as mãos abertas pela testa, pelos cabelos:
—
Oh meu Deus! É horrível! — murmurou. — Deixa-me! É horrível!
Ele adiantava-se com os dentes cerrados; mas Luísa recuava, dizia: Vai-te. Que queres tu? Vai-te! Que fazes tu aqui? Deixa-me!
Ele então tranquilizou-a com a voz subitamente serena e humilde. Não percebia. porque se zangava? Que tinha um beijo? Ele não pedia mais. Que tinha ela imaginado, então? Adorava-a, decerto, mas puramente.
—
Juro-to! — disse com força, batendo no peito.
Fê-la sentar no sofá, sentou-se ao pé dela. Falou-lhe muito sensatamente: —
Via as circunstâncias, e resignar-se-ia. Seria como uma amizade de irmãos, nada mais.
Ela escutava-o, esquecida.
Decerto, dizia ele, aquela paixão era uma tortura imensa. Mas era forte, a Só queria vir vê-la, falar-lhe. Seria um sentimento ideal. — E os seus devoraram-na.
Voltou-lhe a mão, curvou-se, pôs-lhe um beijo cheio na palma. Ela estremeceu-se logo:
—
Não! Vai-te!
—
Bem, adeus.
Levantou-se com um movimento resignado e infeliz. E limpando devagar a seda do chapéu.