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Não havia, veio dizer o criado. Reinaldo fitou Basílio com espanto, com terror, e murmurou soturnamente:

Que abjeção de país!

Quando Luísa entrou, Juliana, ainda vestida, disse-lhe logo à porta:

O Sr. Sebastião está na sala. Tem estado um ror de tempo à espera. . Já cá estava quando eu cheguei.

Tinha vindo com efeito havia meia hora. Quando a Joana lhe veio abrir, muito encarnada, com ar estremunhado, e resmungou que a senhora estava para fora, Sebastião ia logo descer, com o alívio delicioso de uma dificuldade adiada. Mas reagiu, retesou a vontade, entrou, pôs-se a esperar. . Na véspera tinha decidido falar-lhe, avisá-la que aquelas visitas do primo, tão repetidas, com espalhafato, numa rua maligna, podiam comprometê-la. . Era o diabo, dizer-lho!.. Mas era um dever! Por ela, pelo marido, pelo respeito da casa! Era forçoso acautelá-la. . E não se sentia acanhado. Perante as reclamações do dever, vinham-lhe as energias da decisão. O coração batia-lhe um pouco, sim, e estava pálido. . Mas, que diabo havia de lho dizer!. .

E passeando pela sala com as mãos nos bolsos, ia arranjando as suas frases, procurando-as muito delicadas, bem amigas. .

Mas a campainha retiniu, um frufru de vestido roçou o corredor — e a sua coragem engelhou-se como um balão furado. Foi-se logo sentar ao piano, pôs-se a bater vivamente no teclado. Quando Luísa entrou, sem chapéu, descalçando as luvas, ergueu-se, disse embaraçado:

Tenho estado aqui a trautear um bocado. . Estava à espera... Então de onde vem?

Ela sentou-se, cansada. Vinha da modista — disse. Fazia um calor! porque não tinha entrado as outras vezes? Não estava com visitas de cerimónia! Era família, era seu primo que viera de fora.

Está bom, seu primo?

Bom. Tem estado aqui, bastante. Aborrece-se muito em Lisboa, coitado! Ora, quem vive lá fora!

Sebastião repetiu, esfregando devagar os joelhos: Está claro, quem vive lá fora!

E Jorge, tem-lhe escrito? — perguntou Luísa.

Recebi carta ontem.

Também ela. Falaram de Jorge, dos tédios da jornada, do que contava do fantástico parente de Sebastião, da demora provável. .

Faz-nos uma falta, aquele maroto! — disse Sebastião.

Luísa tossiu. Estava um pouco pálida, agora. Passava às vezes a mão pela testa, cerrando os olhos.

Sebastião, de repente, teve uma decisão:

Pois eu vinha, minha rica amiga. . — começou.

Mas viu-a ao canto do sofá com a cabeça baixa, a mão sobre os olhos.

Que tem? Está incomodada?

É a enxaqueca que me veio de repente. Já tinha tido ameaços na rua. E

com uma força!

Sebastião tomou logo o chapéu:

E eu a maçá-la! É necessário alguma coisa? Quer que vá chamar o médico?

Não! Vou-me deitar um momento; passa logo.

Que não apanhasse ar, ao menos, recomendava ele. Talvez sinapismos ou limão nas fontes. . E em todo o caso, se não estivesse melhor que o mandasse chamar. .

Isto passa! E apareça, Sebastião! Não se esconda...

Sebastião desceu, respirou largamente; e pensava:

"Eu não me atrevo, Santo Deus!. ." — Mas à porta, ao levantar os olhos, no fundo escuro da loja de carvão o vulto enorme da carvoeira, de chambre

branco, estendendo o olhar, cocando; por cima, três das Azevedos, entre as velhas cortinas de cassa, juntavam as suas cabecinhas riçadas nalgum conciliáculo maligno! Por trás dos vidros a criada do doutor costurava, com olhares de lado, a cada momento, que lambiam a rua; e ao lado, na loja de móveis, Sentiam-se as expetorações do patriota.

"Não passa um gato que esta gente não dê fé!" — pensou Sebastião. "E

que línguas! Que línguas! Devo fazê-lo, ainda que estoure! Se ela amanhã está melhor, digo-lhe tudo!"

Estava com efeito já boa, às nove horas, no dia seguinte, quando Juliana a foi acordar, com "uma cartinha da senhora D. Leopoldina".

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