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A caravana de hom ens, cavalos, bois e elefante foi engolida definitivam ente pela brum a, nem sequer se distingue a m ancha do extenso vulto do aj untam ento que form am . Vam os ter de correr para alcançá-la. Felizm ente, considerando o pouco tem po que ficám os a assistir ao debate dos hércules da aldeia, o pessoal não poderá ir m uito longe. Em situação de visibilidade norm al ou de brum a m enos parecida com puré que esta, bastaria seguir os rastos das grossas rodas do carro de bois e do carro da intendência no chão am olecido, m as, agora, nem m esm o com o nariz a roçar a terra se conseguia descobrir que por aqui passou gente. E não só gente, tam bém anim ais, com o ficou dito, alguns de certo porte, com o os bois e os cavalos, e em particular o paquiderm e conhecido na corte portuguesa com o salom ão, cuj os pés, só por si, teriam deixado no solo a m arca de um as pegadas enorm es, quase circulares, com o as dos dinossauros de pés redondos, se algum a vez existiram . Já que estam os falando de anim ais, o que parece im possível é que ninguém em lisboa se tenha lem brado de m andar trazer dois ou três cães. Um cão é um seguro de vida, um rastreador de rum os, um a bússola com quatro patas. Bastaria dizer-lhe, Busca, e em m enos de cinco m inutos o teríam os de volta, com o rabo a abanar e os olhos a brilharem de felicidade. Não há vento, porém a névoa parece m over-se em lentos turbilhões com o se o próprio bóreas, em pessoa, a estivesse soprando desde o m ais recôndito norte e dos gelos eternos.

O que não está bem , confessem o-lo, é que, em situação tão delicada com o esta, alguém se tenha posto aqui a puxar o lustro à prosa para sacar alguns reflexos poéticos sem pinta de originalidade.

A esta hora os com panheiros da caravana j á deram com certeza pela falta do ausente, dois deles declararam -se voluntários para voltar atrás e salvar o desditoso náufrago, e isso seria m uito de agradecer se não fosse a fam a de poltrão que o iria acom panhar para o resto da vida, Im aginem , diria a voz pública, o tipo ali sentado, à espera de que aparecesse alguém a salvá-lo, há gente que não tem vergonha nenhum a. É verdade que tinha estado sentado, m as agora j á se levantou e deu coraj osam ente o prim eiro passo, a perna direita adiante, para esconj urar os m alefícios do destino e dos seus poderosos aliados, a sorte e o acaso, a perna esquerda de repente duvidosa, e o caso não era para m enos, pois o chão deixara de poder ver-se, com o se um a nova m aré de nevoeiro tivesse com eçado a subir. Ao terceiro passo j á não consegue nem sequer ver as suas próprias m ãos estendidas à frente, com o para proteger o nariz do choque contra um a porta inesperada. Foi então que um a outra ideia se lhe apresentou, a de que o cam inho fizesse curvas para um lado ou para o outro, e que o rum o que tom ara, um a linha que não queria apenas ser reta, um a linha que queria tam bém m anter-se constante nessa direção, acabasse por conduzi-lo a páram os onde a perdição do seu ser, tanto da alm a com o do corpo, estaria assegurada, neste últim o caso com consequências im ediatas. E tudo isto, ó sorte m ofina, sem um cão para lhe enxugar as lágrim as quando o grande m om ento chegasse. Ainda pensou em voltar para trás, pedir abrigo na aldeia até que o banco de nevoeiro se desfizesse por si m esm o, m as, perdido o sentido de orientação, confundidos os pontos cardeais com o se estivesse num qualquer espaço exterior de que nada soubesse, não achou m elhor resposta que sentar-se outra vez no chão e esperar que o destino, a casualidade, a sorte, qualquer deles ou todos j untos, trouxessem os abnegados voluntários ao m inúsculo palm o de terra em que se encontrava, com o um a ilha no m ar oceano, sem com unicações. Com m ais propriedade, um a agulha em palheiro. Ao cabo de três m inutos,

dorm ia. Estranho anim al é este bicho hom em , tão capaz de trem endas insónias por causa de um a insignificância com o de dorm ir à perna solta na véspera da batalha. Assim sucedeu. Ferrou no sono, e é de crer que ainda hoj e estaria a dorm ir se salom ão não tivesse soltado, de repente, em qualquer parte do nevoeiro, um barrito atroador cuj os ecos deveriam ter chegado às distantes m argens do ganges. Aturdido pelo brusco despertar, não conseguiu discernir em que direção poderia estar o em issor sonoro que decidira salvá-lo de um enregelam ento fatal, ou pior ainda, porque isto é terra de lobos, e um hom em sozinho e desarm ado não tem salvação ante um a alcateia ou um sim ples exem plar da espécie. A segunda cham ada de salom ão foi m ais potente ainda que a prim eira, com eçou por um a espécie de gorgolej o surdo nos abism os da garganta, com o um rufar de tam bores, a que im ediatam ente se sucedeu o clangor sincopado que form a o grito deste anim al. O hom em j á vai atravessando a brum a com o um cavaleiro disparado à carga, de lança em riste, enquanto m entalm ente im plora, Outra vez, salom ão, por favor, outra vez. E

salom ão fez-lhe a vontade, soltou novo barrito, m enos forte, com o de sim ples confirm ação, porque o náufrago que era j á deixara de o ser, j á vem chegando, aqui está o carro da intendência da cavalaria, não se lhe podem distinguir os porm enores porque as coisas e as pessoas são com o borrões indistintos, outra ideia nos ocorreu agora, bastante m ais incóm oda, suponham os que este nevoeiro é dos que corroem as peles, a da gente, a dos cavalos, a do próprio elefante, apesar de grossa, que não há tigre que lhe m eta o dente, os nevoeiros não são todos iguais, um dia se gritará gás, e ai de quem não levar na cabeça um a celada bem aj ustada. A um soldado que passa, levando o cavalo pela reata, o náufrago pergunta-lhe se os voluntários j á regressaram da m issão de salvam ento e resgate, e ele respondeu à interpelação com um olhar desconfiado, com o se estivesse diante de um provocador, que havê-los j á os havia em abundância no século dezasseis, basta consultar os arquivos da inquisição, e diz, secam ente, Onde é que você foi buscar essas fantasias, aqui não houve nenhum pedido de voluntários, com um nevoeiro destes a única atitude sensata foi a que tom ám os, m anter-nos j untos até que ele decidisse por si m esm o levantar-se, aliás, pedir voluntários não é m uito do estilo do com andante, em geral lim ita-se a apontar tu, tu e tu, vocês, em frente, m arche, o com andante diz que, heróis, heróis, ou vam os sê-lo todos, ou ninguém . Para tornar m ais clara a vontade de acabar a conversa, o soldado içou-se rapidam ente para cim a do cavalo, disse até logo e desapareceu no nevoeiro. Não ia satisfeito consigo m esm o.

Tinha dado explicações que ninguém lhe havia pedido, feito com entários para que não estava autorizado. No entanto, tranquilizava-o o facto de que o hom em , em bora não parecesse ter o físico adequado, deveria pertencer, outra possibilidade não cabia, pelo m enos, ao grupo daqueles que haviam sido contratados para aj udar a em purrar e puxar os carros de bois nos passos difíceis, gente de poucos falares e, em princípio, escassíssim a im aginação. Em princípio, diga-se, porque ao hom em perdido no nevoeiro im aginação foi o que pareceu não lhe ter faltado, haj a vista a ligeireza com que tirou do nada, do não acontecido, os voluntários que deveriam ter ido salvá-lo.

Felizm ente para a sua credibilidade pública, o elefante é outra coisa. Grande, enorm e, barrigudo, com um a voz de estarrecer aos m enos tim oratos e um a trom ba com o não a tem nenhum outro anim al da criação, o elefante nunca poderia ser produto de um a im aginação, por m uito fértil e dada ao risco que fosse. O elefante, sim plesm ente, ou existiria, ou não existiria. É portanto hora de ir visitá-lo, hora de lhe agradecer a energia com que usou a salvadora trom beta que deus lhe deu, se este sítio fosse o vale de j osafá teriam ressuscitado os m ortos, m as sendo apenas o que é, um pedaço bruto de terra portuguesa afogado pela névoa onde alguém , quem , esteve a ponto de

m orrer de frio e abandono, direm os, para não perder de todo a trabalhosa com paração em que nos m etem os, que há ressurreições tão bem adm inistradas que chega a ser possível executá-las antes do passam ento do próprio suj eito. Foi com o se o elefante tivesse pensado, Aquele pobre diabo vai m orrer, vou ressuscitá-lo. E aqui tem os o pobre diabo desfazendo-se em agradecim entos, em j uras de gratidão para toda a vida, até que o cornaca se decidiu a perguntar, Que foi que o elefante lhe fez para que você lhe estej a tão agradecido, Se não fosse ele, eu teria m orrido de frio ou teria sido com ido pelos lobos, E com o conseguiu ele isso, se não saiu daqui desde que acordou, Não precisou de sair daqui, bastou-lhe soprar na sua trom beta, eu estava perdido no nevoeiro e foi a sua voz que m e salvou, Se alguém pode falar das obras e feitos de salom ão, sou eu, que para isso sou o seu cornaca, portanto não venha para cá com essa treta de ter ouvido um barrito, Um barrito, não, os barritos que estas orelhas que a terra há-de com er ouviram foram três. O cornaca pensou, Este fulano está doido varrido, variou-se-lhe a cabeça com a febre do nevoeiro, foi o m ais certo, tem -se ouvido falar de casos assim . Depois, em voz alta, Para não estarm os aqui a discutir, barrito sim , barrito não, barrito talvez, pergunte você a esses hom ens que aí vêm se ouviram algum a coisa. Os hom ens, três vultos cuj os difusos contornos pareciam oscilar e trem er a cada passo, davam im ediata vontade de perguntar, Onde é que vocês querem ir com sem elhante tem po. Sabem os que não era esta a pergunta que o m aníaco dos barritos lhes fazia neste m om ento e sabem os a resposta que lhe estavam a dar. O

que não sabem os é se algum as destas coisas estão relacionadas um as com as outras, e quais, e com o. O certo é que o sol, com o um a im ensa vassoura lum inosa, rom peu de repente o nevoeiro e em purrou-o para longe. A paisagem fez-se visível no que sem pre havia sido, pedras, árvores, barrancos, m ontanhas. Os três hom ens j á não estão aqui. O cornaca abre a boca para falar, m as torna a fechá-la. O m aníaco dos barritos com eçou a perder consistência e volum e, a encolher-se, tornou-se m eio redondo, transparente com o um a bola de sabão, se é que os péssim os sabões que se fabricam neste tem po são capazes de form ar aquelas m aravilhas cristalinas que alguém teve o génio de inventar, e de repente desapareceu da vista. Fez plof e sum iu-se. Há onom atopeias providenciais. Im agine-se que tínham os de descrever o processo de sum ição do suj eito com todos os porm enores. Seriam precisas, pelo m enos, dez páginas. Plof.

Casualm ente, talvez por efeito de qualquer alteração atm osférica, o com andante achou-se a pensar na m ulher e nos filhos, ela, grávida de cinco m eses, eles, um rapazinho e um a m enina, com seis e quatro anos respectivam ente. As rudes gentes destas épocas que ainda m al saíram da barbárie prim eva prestam tão pouca atenção aos sentim entos delicados que raras vezes lhes dão uso. Em bora j á estej a a ser notada por aqui certa ferm entação de em oções na trabalhosa constituição de um a identidade nacional coerente e coesa, a saudade e os seus subprodutos ainda não foram integrados em portugal com o filosofia habitual de vida, o que tem dado origem a não poucas dificuldades de com unicação na sociedade em geral, e tam bém a não poucas perplexidades na relação de cada um consigo m esm o. Por exem plo, em nom e do m ais óbvio senso com um , não seria aconselhável que nos chegássem os ao estribo do com andante para perguntar, Diga-m e, com andante, tem saudades da sua esposa e dos seus filhinhos. O interpelado, ainda que não com pletam ente desprovido de gosto e sensibilidade, com o j á se deve ter podido observar em diversos passos deste relato, guardando sem pre, claro está, a m ais recatada discrição para não chocar o pudor da personagem , olhar-nos-ia com surpresa pela nossa patente falta de tato e dar-nos-ia um a resposta vaga, aérea, sem princípio nem fim , deixando-nos, pelo m enos, com sérias preocupações sobre a vida íntim a do casal. É certo que o com andante nunca cantou um a serenata nem escreveu, que se saiba, um sonetilho, um só que fosse, m as isto não significa que não sej a, digam os que por natureza, m uito com petente para estim ar as coisas belas que têm vindo a ser criadas pelo engenho dos seus sem elhantes. A um a delas, por exem plo, poderia tê-la trazido consigo, em brulhada em panos na m ochila, com o j á o fizera em outras deslocações m ais ou m enos bélicas, m as desta vez preferiu deixá-la no seguro da casa. Dada a escassez do soldo que cobra, não raro com atraso, o qual, com o é evidente, não foi calculado pela fazenda para luxos da tropa, o com andante, se quis a sua j oia, j á lá vai um a boa dúzia de anos, teve de vender um boldrié rico de m ateriais, delicado de desenho e notável de decoração, em todo o caso m ais para luzir nos salões que no cam po de batalha, um a m agnífica peça de equipam ento m ilitar que tinha sido propriedade do avô m aterno e que, desde então, se convertera em obj eto de desej o de quantos a viam . No seu lugar, m as não para os m esm os fins, encontra-se, desde então, um grosso volum e, com o título de am adis de gaula, obra de que terá sido autor, com o j uram alguns eruditos m ais patriotas, um tal vasco de lobeira, português do século catorze, a qual obra viria a ser publicada em saragoça, em tradução castelhana, em m il quinhentos e oito por garci rodriguez de m ontalvo, que lhe acrescentou uns quantos capítulos de aventuras e am ores e em endou e corrigiu os antigos textos. Suspeita o com andante que o seu exem plar veio de cepa bastarda, de um a edição dessas a que hoj e cham am os piratas, o que m ostra quão de longe vêm j á certas ilícitas práticas com erciais. Salom ão, outras vezes o tem os dito, falam os do rei de j udá, não do elefante, tinha razão quando escreveu que não havia nada de novo debaixo da roda do sol. Custa a im aginar que tudo j á fosse igual a tudo naquelas bíblicas eras, quando a nossa pertinaz inocência continua a obstinar-se em im aginá-las líricas, bucólicas e pastoris, por tão próxim as estarem ainda dos prim eiros tenteios da nossa ocidental civilização.

O com andante anda a ler pela quarta ou quinta vez o seu am adis. Com o em qualquer outra novela de cavalarias, não faltam batalhas sangrentas, pernas e braços am putados cerce, corpos cortados pela cintura, o que diz m uito sobre a força bruta daqueles espirituais cavaleiros, um a vez que nessa época não eram conhecidas, nem im agináveis, as virtudes seccionadoras das ligas m etálicas com o vanádio e o m olibdénio, hoj e fáceis de encontrar em qualquer faca de cozinha, o que dem onstra quanto tem os vindo a progredir na boa direção. O livro conta com m inúcia e deleite os atribulados am ores de am adis de gaula e oriana, am bos filhos de reis, o que não foi obstáculo para que a m ãe dele tivesse decidido enj eitá-lo, m andando que levassem o m enino ao m ar e ali, num caixote de m adeira, com um a espada ao lado, o abandonassem à m ercê das correntes m arítim as e do ím peto das ondas. Quanto a oriana, a pobre, contra sua vontade, viu-se prom etida em casam ento pelo próprio pai ao im perador de rom a, quando todos os seus desej os e ilusões estavam postos em am adis, a quem am ava desde os sete anos, quando o m ocinho tinha doze, em bora pela com pleição física j á aparentasse os quinze. Verem -se e am arem -se havia sido obra de um instante de deslum bram ento que perm aneceu intacto durante toda a vida. Era o tem po em que a andante cavalaria se havia proposto term inar a obra de deus, isto é, elim inar o m al do planeta. Era tam bém o tem po em que o am or só o era se fosse extrem o, radical, em que a fidelidade absoluta era um dom do espírito tão natural com o o com er e o beber o era do corpo.

E, falando de corpo, é caso para perguntar em que estado estaria o de am adis, tão cosido de cicatrizes, abraçado ao corpo perfeito da sem par oriana. As arm aduras, sem o m olibdénio e o vanádio, de pouco poderiam servir, e o narrador da história não disfarça a fragilidade das chapas e das cotas de m alha. Um sim ples golpe de espada inutilizava um elm o e abria a cabeça que estava dentro. É assom broso com o aquela gente conseguiu chegar viva ao século em que estam os. Já gostaria eu, suspirou o com andante. Ao m enos por um tem po não se im portaria de ceder a sua patente de capitão a troco de cavalgar, em figura de um novo am adis de gaula, pelas praias da ilha firm e ou pelos bosques e serranias onde se acoitavam os inim igos do senhor. A vida de um capitão de cavalos português, em tem po de paz, é um a com pleta pasm aceira, há que dar voltas e voltas à cabeça para encontrar algo em que ocupar com suficiente proveito distrativo as horas m ortas do dia. O capitão im agina a am adis cavalgando por estas penhas agrestes, com o im piedoso pedregal a castigar os cascos do cavalo e o escudeiro gandalim a dizer ao am igo que é tem po de descansar. O voto fantasista fê-lo desviar o rum o do pensam ento para um a questão fora da literatura, cingida à disciplina m ilitar naquilo que ela tem de m ais básico, o cum prim ento das ordens recebidas. Se o com andante tivesse podido entrar nas cogitações do rei dom j oão terceiro no m om ento, atrás descrito, em que a real pessoa im aginou salom ão e a sua com itiva a pisar as extensas e m onótonas distâncias de castela, não estaria agora aqui, subindo e descendo estes barrancos, ladeando estas perigosas ladeiras, enquanto o boieiro tenta descobrir cam inhos não dem asiado desviados de cada vez que os incipientes e m al definidos carreiros desaparecem sob os penhascos rolados e as lascas de xisto. Em bora o rei não tivesse chegado a expressar a sua opinião e ninguém se tivesse atrevido a pedir-lha por m otivo tão de som enos, o oficial com andante-geral da cavalaria deu a sua aprovação, a rota pelas planícies de castela era realm ente a m ais indicada, a m ais suave, praticam ente, com o j á se disse, um passeio ao cam po.

Estava-se nisto, e dir-se-ia não haver qualquer razão para um a reconsideração do itinerário, quando o secretário pêro de alcáçova carneiro, casualm ente inform ado do acordo, resolveu tom ar cartas no assunto. Disse ele, Não m e parece bem , senhor, isso a que estais a cham ar

passeio ao cam po, se não usarm os de cautela, poderá vir a ter consequências negativas, m uito sérias, m esm o graves, Não estou a ver porquê, senhor secretário, Im agine que viessem a surgir problem as de abastecim ento com as populações durante a travessia de castela, tanto por causa da água com o por causa das forragens, im agine que a gente de lá se recusa a quaisquer tratos de com pra e venda conosco, m esm o indo isso contra os seus interesses no m om ento, Sim , pode suceder, reconheceu o oficial, Im agine tam bém que as quadrilhas de bandoleiros, que as há por lá, m uito m ais que aqui, vendo tão reduzida a proteção que dam os ao elefante, trinta soldados de cavalaria não são nada, Perm ita-m e não concordar consigo, senhor secretário, se trinta soldados portugueses tivessem estado nas term ópilas de um lado ou do outro, por exem plo, o resultado da luta teria sido diferente, Peço-lhe desculpa, senhor, longe de m im a intenção de ofender os brios do nosso glorioso exército, m as, torno a dizer, im agine que esses bandidos, que certam ente sabem o que é o m arfim , se j untam para atacar-nos, m atar o elefante e arrancar-lhe os dentes, Tenho ouvido dizer que as balas não atravessam a pele desses anim ais, É possível, m as haveria certam ente outras m aneiras de o m atar, o que peço a vossa alteza, sobretudo, é que pense na vergonha que para nós seria perder o presente para o arquiduque m axim iliano num a escaram uça com bandoleiros espanhóis e em território espanhol, Que pensa então o senhor secretário que devam os fazer, Para a rota de castela só existe um a alternativa, a nossa própria, ao longo da fronteira, em direção ao norte, até castelo rodrigo, São m aus cam inhos, disse o oficial, o senhor secretário não conhece aquilo, Pois não, m as não tem os outra solução, e esta, ainda por cim a, tem um a vantagem com plem entar, Qual, senhor secretário, A de poderm os fazer a m aior parte do percurso em território nacional, Porm enor im portante, sem dúvida, o senhor secretário pensa em tudo.

Duas sem anas depois desta conversação tornou-se evidente que o secretário pêro de alcáçova carneiro, afinal, não havia pensado em tudo. Um m ensageiro do secretário do arquiduque chegou com um a carta em que, entre outras frioleiras que pareciam postas ali para desviar a atenção, se perguntava por que ponto da fronteira entraria o elefante, pois aí iria estar um destacam ento m ilitar espanhol ou austríaco para o receber. O secretário português respondeu pela m esm a via, inform ando que a entrada se faria pela fronteira de castelo rodrigo, e, ato contínuo, com eçou a organizar o seu contra-ataque. Ainda que estas palavras possam parecer um exagero fora de propósito, tendo em conta que a paz reina entre os dois países ibéricos, a verdade é que o sexto sentido de que pêro de alcáçova carneiro é dotado não tinha gostado nada de ver na carta do seu colega espanhol aquela palavra receber. O hom em podia ter usado os term os acolher ou dar as boas-vindas, m as não, ou dissera m ais do que pensava ou, com o se costum a dizer, fugira-lhe a boca para a verdade. Um as quantas instruções ao capitão de cavalos sobre o procedim ento a seguir evitarão m al-entendidos, pensara pêro de alcáçova carneiro, se o outro lado estiver na m esm a disposição. O resultado destes planos estratégicos está a ser anunciado pelo sargento, noutro lugar e uns quantos dias depois, neste preciso instante, Vêm aí atrás dois cavaleiros, m eu com andante. O com andante olhou, era evidente que os ginetes, num trote largo e eficaz, vinham com pressa. O sargento tinha m andado fazer alto à coluna, e, pelo sim , pelo não, pusera os visitantes na m ira discreta de um as quantas espingardas. Com os m em bros trém ulos e a espum a a cair-lhes da boca, os cavalos resfolgaram quando os fizeram estacar. Os dois hom ens saudaram , e um deles disse, Som os portadores de um a m ensagem do secretário pêro de

alcáçova carneiro para o com andante da força que acom panha o elefante, Sou eu esse com andante. O hom em abriu a m ochila, retirou de lá um papel dobrado em quatro, selado com o tim bre oficial da secretaria do reino, e entregou-o ao com andante, que se afastou um as dezenas de passos para o ler. Quando regressou brilhavam -lhe os olhos. Cham ou o sargento de parte e disse-lhe, Sargento, m ande dar de com er a estes hom ens e que lhes preparem um farnel para o cam inho, Sim , m eu com andante, Avise toda a gente de que, a partir de agora, avançarem os a m archas forçadas, Sim , m eu com andante, E que o tem po da sesta será reduzido a m etade, Sim , m eu com andante, Tem os de chegar a castelo rodrigo antes dos espanhóis, devem os consegui-lo, eles não estão prevenidos, nós, sim , E se não o conseguirm os, atreveu-se o sargento a perguntar, Consegui-lo-em os, de todos os m odos quem chegar prim eiro, espera. Tão sim ples com o isto, quem chegar prim eiro, espera, para isso não era preciso que o secretário pêro de alcáçova carneiro tivesse escrito a carta. Algo m ais haverá.

Os lobos apareceram no dia seguinte. Tanto deles tem os falado aqui que, por fim , decidiram m ostrar-se. Não parecem vir com ânim o de guerra, talvez porque o resultado da caçada, durante as últim as horas da noite, tenha bastado para confortar-lhes o estôm ago, além disso, um a coluna destas, de m ais de cinquenta hom ens, com um a boa parte deles arm ados, im põe respeito e prudência, os lobos podem ser m aus, m as estúpidos não são. Peritos na avaliação relativa das forças em presença, as próprias e as alheias, não vão atrás de entusiasm os, não perdem a cabeça, talvez porque não tenham bandeira nem charanga para levá-los à glória, quando se lançam ao ataque é para ganhar, regra que, em todo o caso, com o se verá um pouco m ais adiante, adm ite algum a exceção. Estes lobos nunca tinham visto um elefante. Não é de estranhar que algum deles, m ais im aginativo, tivesse pensado, se os lobos têm um pensam ento paralelo aos processos m entais hum anos, na sorte grande que seria para a alcateia dispor daquelas toneladas de carne logo à saída da toca, a m esa sem pre posta, alm oço, j antar e ceia. Não sabe o ingénuo canis lupus signatus, nom e latino do lobo ibérico, que naquela pele nem as balas conseguem entrar, convindo no entanto reconhecer a enorm e diferença que há entre um a bala das antigas, dessas que quase nunca sabiam aonde iam , e os dentes destes três representantes do povo lupino que, do alto do cabeço a que treparam , contem plam o anim ado espetáculo da coluna de hom ens, cavalos e bois que se prepara para um a nova etapa no cam inho para castelo rodrigo. É bem possível que a pele de salom ão não pudesse resistir por m uito tem po à ação concertada de três dentaduras treinadas no duro ofício de com er o que aparece para sobreviver. Os hom ens fazem com entários sobre os lobos, e um deles diz para os que estão perto, Se algum a vez forem atacados por um bicho destes e só tiverem um pau para defender-se, arranj em -se de m aneira que ele nunca consiga fincar-lhe os dentes, Porquê, perguntou alguém , Porque o lobo irá avançando pouco a pouco ao longo do pau, sem pre com os dentes cravados na m adeira, até chegar ao teu alcance e saltar-te em cim a, Diabo de anim al, Há que dizer que os lobos não são, por natureza, inim igos do hom em , e, se às vezes o parecem , é porque som os para eles um obstáculo ao livre desfrute do que o m undo tem para oferecer a um lobo honrado, Em todo o caso aqueles três não parecem dar m ostras de hostilidade ou m ás ideias a nosso respeito, Devem ter com ido, além disso som os dem asiados aqui para que se atrevessem a assaltar, por exem plo, um destes cavalos, que para eles representam um petisco de prim eira classe, Vão-se em bora, gritou um soldado. Era verdade. A im obilidade em que haviam perm anecido todo o tem po desde que chegaram rom pera-se. Agora, recortados prim eiro contra o fundo de nuvens e m ovendo-se com o se em vez de andar deslizassem , os lobos, um a um , desapareceram . Voltarem os a vê-los, perguntou o soldado, É possível, quanto m ais não sej a para saberem se ainda continuam os por aqui ou se algum cavalo ficou para trás estropeado, disse o hom em que sabia de lobos. Lá adiante, o corneta fez ouvir a ordem de preparar para a m archa. Mais ou m enos m eia hora depois a coluna, pesadam ente, com eçou a m over-se, à frente o carro de bois, a seguir o elefante e os hom ens para as forças, depois a cavalaria, e, a fechar o cortej o, o carro da intendência. A fadiga era geral. Entretanto, o cornaca j á tinha dito ao com andante que o salom ão vinha cansado,

e não seria tanto por obra da distância percorrida desde lisboa com o pelo péssim o estado dos cam inhos, se insistirm os em cham ar-lhes assim . O com andante respondeu-lhe que em um dia m ais, no m áxim o dois, avistariam castelo rodrigo, Se form os os prim eiros a chegar, acrescentou, o elefante poderá descansar os dias ou as horas que os espanhóis tardarem , descansará salom ão e todos quantos aqui vão, hom ens e bestas, E se form os nós a chegar depois, Depende da pressa que eles tragam , das ordens que tenham , suponho que tam bém hão-de querer descansar ao m enos um dia, Vossa senhoria sabe que estam os à sua conta, por m im só desej o que, até ao fim , o seu benefício sej a o nosso benefício, Assim há-de ser, disse o com andante. Deu de esporas ao cavalo e foi adiante, a anim ar o boieiro, de cuj a ciência de condução dependia em m uito a velocidade da progressão da coluna, Vam os, hom em , espevita-m e esses bois, gritou, castelo rodrigo j á está perto, não tarda m uito que possam os dorm ir um a noite debaixo de telha, E com er com o gente, espero, desabafou o boieiro em surdina, para que não o ouvissem . Em todo o caso, as ordens dadas pelo com andante não caíram em saco roto. O boieiro chegou a ponteira da aguilhada ao cachaço dos bois, com efetivo e im ediato resultado gritou um as palavras de incitam ento no dialeto com um , um esticão brusco que se m anterá talvez durante os próxim os dez m inutos ou um quarto de hora, assim o boieiro não deixe esm orecer a cham a. Acam param j á com o sol-posto e as prim eiras avançadas da noite, m ais m ortos do que vivos, fam intos m as sem vontade de com er, tal era a fadiga. Felizm ente, os lobos não voltaram . Se o tivessem feito poderiam ter circulado a seu bel-prazer pelo m eio do acam pam ento e escolher, entre os cavalos, a m ais suculenta vítim a. É certo que um roubo tão desproporcionado não poderia prosperar, um equino é um anim al dem asiado grande para ser levado de arraste assim sem m ais nem m enos, m as se tivéssem os de descrever aqui o susto dos expedicionários quando dessem pela presença dos lobos infiltrados, de certeza não encontraríam os palavras bastante fortes, seria um salve-se quem puder. Dêm os graças ao céu por term os escapado a essa prova. Dêm os tam bém graças ao céu porque j á se avistam as im ponentes torres do castelo, dá vontade de dizer com o o outro, Hoj e estarás com igo no paraíso, ou, repetindo as palavras m ais terrenais do com andante, Hoj e dorm irem os debaixo de telha, é bem certo que os paraísos não são todos iguais, há-os com huris e sem huris, porém , para saberm os em que paraíso estam os basta que nos deixem espreitar à porta. Um a parede que protej a da nortada, um telhado que defenda da chuva e do sereno, e pouco m ais é preciso para viver no m aior conforto do m undo. Ou nas delícias do paraíso.

Quem venha seguindo com suficiente atenção este relato, terá j á estranhado que depois do divertido episódio da patada que salom ão aplicou ao padre da aldeia não tenha havido referência a outros encontros com os habitantes destas terras, com o se viéssem os atravessando um deserto e não um país europeu civilizado que, ainda por cim a, com o nem a m ocidade das escolas ignora, deu novos m undos ao m undo. Encontros, houve-os, m as de passagem , no sentido m ais im ediato do term o, isto é, as pessoas saíam das suas casas para ver quem vinha e davam com o elefante que a uns os fazia benzerem -se de pasm o e apreensão e a outros, ainda que apreensão tam bém , suscitava o riso, é de crer que por causa da trom ba. Nada, portanto, que se com pare ao entusiasm o e à quantidade de rapazes e algum adulto desocupado que vêm correndo desde a vila à notícia da viagem do elefante, que não se sabe com o chegou aqui, à notícia nos referim os, não ao elefante, que esse ainda tardará. Nervoso, excitado, o com andante deu ordem ao sargento para que m andasse perguntar a um dos rapazes m ais crescidos se os m ilitares espanhóis j á

tinham chegado. O rapaz devia ser galego porque respondeu à pergunta com outra pergunta, Que vêm eles cá fazer, vai haver guerra, Responde, chegaram , ou não chegaram os espanhóis, Não senhor, não chegaram . A inform ação foi levada ao com andante em cuj a boca, no m esm o instante, apareceu o m ais feliz dos sorrisos. Não havia dúvida, a sorte parecia decidida a favorecer as arm as de portugal.

Ainda dem oraram quase um a hora a entrar na vila, um a caravana de hom ens e anim ais perdidos de cansaço, que m al tinham forças para levantar o braço ou acenar com as orelhas em agradecim ento aos aplausos com que os vizinhos de castelo rodrigo a recebiam . Um representante do alcaide guiou-os até à praça de arm as da fortificação, onde podiam caber pelo m enos dez caravanas com o aquela. Aí esperavam -nos três m em bros da fam ília dos castelões, que depois acom panharam o com andante a inspecionar os espaços disponíveis para abrigar os hom ens, sem esquecer os que os espanhóis viriam a necessitar no caso de não bivacarem fora do castelo. O alcaide, a quem o com andante foi apresentar os seus respeitos depois da inspeção, disse, O m ais provável é que instalem o acam pam ento fora das m uralhas do castelo, o que, além do resto, teria a grande vantagem de reduzir a possibilidade de confrontações, Por que pensa vossa senhoria que poderá haver confrontações, perguntou o com andante, Com estes espanhóis nunca se sabe, desde que têm um im perador parece que andam com o rei na barriga, e m uito pior ainda seria se em vez de virem os espanhóis viessem os austríacos, É m á gente, perguntou o com andante, Julgam -se superiores aos m ais, Isso é pecado geral, eu, por exem plo, j ulgo-m e superior aos m eus soldados, os m eus soldados j ulgam -se superiores aos hom ens que vieram para o trabalho pesado, E o elefante, perguntou o alcaide, sorrindo, O elefante não j oga, não é deste m undo, respondeu o com andante, Vi-o chegar de um a j anela, de facto é um anim al soberbo, gostaria de olhá-lo de m ais perto, É todo seu quando quiser, Não saberia que fazer com ele, a não ser alim entá-lo, Previno vossa senhoria de que este bicho requer m uito alim ento, Assim tenho ouvido dizer, e não m e apresento para ser proprietário de um elefante, sou um sim ples alcaide do interior, Isto é, nem rei nem arquiduque, Tal qual, nem rei nem arquiduque, só disponho do que posso cham ar m eu. O com andante levantou-se, Não lhe ocupo m ais tem po, senhor, m uito obrigado pela atenção com que m e recebeu, Foi serviço do rei, com andante, só seria serviço m eu se aceitasse ser hóspede desta casa enquanto perm anecesse em castelo rodrigo, Agradeço o convite, que m e honra m uito m ais do que poderá im aginar, m as devo estar com os m eus hom ens, Com preendo, tenho obrigação de com preender, no entanto espero que não se escusará a um a ceia num dos próxim os dias, Com todo o gosto, em bora dependa do tem po que tiver de esperar, im agine que os espanhóis aparecem j á am anhã, ou m esm o ainda hoj e, Tenho esculcas no outro lado encarregados de dar aviso, Com o o fazem , Com pom bos-correios. O com andante pôs cara de dúvida, Pom bos-correios, estranhou, tenho ouvido falar deles, m as, francam ente, não acredito que um pom bo sej a capaz de voar durante tantas horas com o dizem , em distâncias enorm es, para ir dar, sem se enganar, ao pom bal onde nasceu, Pois vai ter ocasião de verificar com os seus próprios olhos, se m e perm ite m andarei cham á-lo quando o pom bo chegar para que assista à retirada e à leitura da m ensagem que ele trará atada a um a pata, Se isso acontecer, só faltará que as m ensagens nos passem a chegar pelo ar sem precisarem das asas de nenhum pom bo, Suponho que seria um pouco m ais difícil, sorriu o alcaide, m as, havendo m undo, tudo poderá suceder, Havendo m undo, Não existe outra m aneira, com andante, o m undo é

indispensável, Não devo roubar-lhe m ais tem po, Deu-m e um a grande satisfação conversar com vossa m ercê, Para m im , senhor alcaide, depois desta viagem , foi com o um copo de água fresca, Um copo de água fresca que não lhe ofereci, Fica para a próxim a vez, Não se esqueça do m eu convite, disse o alcaide quando o com andante j á descia a escadaria de pedra, Serei pontual, senhor.

Mal entrou no castelo, ordenou que se apresentasse o sargento, a quem deu instruções sobre o destino próxim o dos trinta hom ens que tinham vindo para os trabalhos pesados. Um a vez que haviam deixado de ser necessários, ficariam ainda a descansar am anhã, m as regressariam no dia seguinte, Avise o pessoal da intendência para que prepare um a razoável quantidade de alim entos, trinta hom ens são trinta bocas, trinta línguas e um a quantidade enorm e de dentes, claro que não será possível provê-los de com ida para todo o tem po que levarem a chegar a lisboa, m as eles que se governem pelo cam inho, trabalhando ou, Ou roubando, acudiu o sargento à suspensão para não deixar a frase inacabada, Que se arranj em com o puderem , disse o com andante, recorrendo, à falta de m elhor, a um a das frases que com põem a panaceia universal, à cabeça da qual se exibe, com o exem plo perfeito da m ais descarada hipocrisia pessoal e social, aquela que recom endava paciência ao pobre a quem se tinha acabado de negar a esm ola. Os hom ens que haviam exercido de capatazes quiseram saber quando poderiam ir cobrar pelo trabalho, e o com andante m andou dizer que não sabia, m as que se apresentassem no paço e m andassem recado ao secretário ou a quem por ele pudesse responder, Mas aconselho-vos, a frase repetiu-a o sargento, palavra por palavra, a que não vades para lá todos j untos, pelo m au ar que dariam trinta m altrapilhos à porta do paço com o se quisessem assaltá-lo, em m inha opinião deverão ir os capatazes, e ninguém m ais, e esses que tratem de ir tão asseados quanto lhes sej a possível. Um deles, m ais tarde, encontrando por acaso o com andante, pediu-lhe licença para falar, só queria dizer que tinha m uita pena de não poder ir a valladolid. O com andante não soube que responder, durante alguns segundos olharam -se um ao outro em silêncio, e logo foi cada qual à sua vida.

Aos soldados, o com andante fez-lhes um rápido resum o da situação, esperariam ali que chegassem os espanhóis, ainda não se sabe quando será, por enquanto não há notícias, neste ponto conteve no últim o instante a referência aos pom bos-correios, consciente dos inconvenientes de qualquer espécie de relaxação da disciplina. Não sabia que entre os subordinados havia dois am antes dos pom bos, dois colum bófilos, palavra talvez ainda não existente na época, salvo porventura entre iniciados, m as que j á devia andar a bater às portas, com aquele ar falsam ente distraído que têm as palavras novas, a pedir que as deixem entrar. Os soldados estavam de pé, em posição de repouso, postura esta que era executada ad libitum , sem preocupações de harm onia corporal. Tem po virá em que estar em repouso form al custará quase tanto esforço a um m ilitar com o a m ais tensa das sentinelas, com o inim igo em boscado no outro lado da estrada.

No solo, estendidas, havia paveias de feno com espessura suficiente para que as asas das om oplatas não tivessem de sofrer dem asiado no contato com a dureza intratável das laj es.

Ensarilhadas, as espingardas alinhavam -se ao longo de um a parede. Provera a deus que não venha a ser necessário dar-lhes uso, pensou o oficial, preocupado com a possibilidade de que a entrega de salom ão viesse a descam bar, por falta de tato de um lado ou do outro, em casus belli.

Tinha bem presentes na m em ória as palavras do secretário pêro de alcáçova carneiro, tam bém as explícitas, claro, m as sobretudo as que, apesar de não terem sido escritas, se subentendiam ,

isto é, se os espanhóis, ou os austríacos, ou uns e outros, vierem a m ostrar-se antipáticos ou provocadores, deverá proceder-se em conform idade. O com andante não conseguia im aginar sob que pretexto os soldados que vinham a cam inho, espanhóis ou austríacos sej am eles, se m ostrariam provocadores, ou sequer apenas antipáticos. Um com andante de cavalaria não tem as luzes nem a experiência política de um secretário de estado, portanto fará bem em deixar-se guiar por quem m ais sabe, até chegar, no caso de que chegue, a hora da ação. Estava o com andante dando voltas a estes pensam entos quando subhro fez a sua entrada na im provisada cam arata onde algum as paveias de feno lhe haviam sido reservadas por diligência do sargento.

Ao vê-lo, o com andante sentiu um desconforto que só poderia ser atribuído à incóm oda consciência de que não se havia interessado pelo estado de saúde de salom ão, não o tinha ido ver, com o se, com a chegada a castelo rodrigo, a sua m issão tivesse term inado. Com o está o salom ão, perguntou, Quando o deixei, dorm ia, respondeu o cornaca, Valente anim al, exclam ou com falso entusiasm o o com andante, Veio aonde o trouxeram , a força e a resistência nasceram com ele, não são virtude própria, Vej o-te m uito severo com o pobre do salom ão, Talvez sej a por causa da história que um dos aj udas m e acabou de contar, Que história é essa, perguntou o com andante, A história de um a vaca, As vacas têm história, tornou o com andante a perguntar, sorrindo, Esta, sim , foram doze dias e doze noites nuns m ontes da galiza, com frio, e chuva, e gelo, e lam a, e pedras com o navalhas, e m ato com o unhas, e breves intervalos de descanso, e m ais com bates e investidas, e uivos, e m ugidos, a história de um a vaca que se perdeu nos cam pos com a sua cria de leite, e se viu rodeada de lobos durante doze dias e doze noites, e foi obrigada a defender-se e a defender o filho, um a longuíssim a batalha, a agonia de viver no lim iar da m orte, um círculo de dentes, de goelas abertas, as arrem etidas bruscas, as cornadas que não podiam falhar, de ter de lutar por si m esm a e por um anim alzinho que ainda não se podia valer, e tam bém aqueles m om entos em que o vitelo procurava as tetas da m ãe, e sugava lentam ente, enquanto os lobos se aproxim avam , de espinhaço raso e orelhas aguçadas. Subhro respirou fundo e prosseguiu, Ao fim dos doze dias a vaca foi encontrada e salva, m ais o vitelo, e foram levados em triunfo para a aldeia, porém o conto não vai acabar aqui, continuou por m ais dois dias, ao fim dos quais, porque se tinha tornado brava, porque aprendera a defender-se, porque ninguém podia j á dom iná-la ou sequer aproxim ar-se dela, a vaca foi m orta, m ataram -na, não os lobos que em doze dias vencera, m as os m esm os hom ens que a haviam salvo, talvez o próprio dono, incapaz de com preender que, tendo aprendido a lutar, aquele antes conform ado e pacífico anim al não poderia parar nunca m ais.

Um silêncio respeitoso reinou durante alguns segundos na grande sala de pedra. Os soldados presentes, em bora não m uito experim entados em guerras, baste dizer que os m ais novos nunca haviam cheirado a pólvora nos cam pos de batalha, assom bravam -se no seu foro íntim o pela coragem de um irracional, um a vaca, im agine-se, que havia m ostrado possuir sentim entos tão hum anos com o o am or de fam ília, o dom do sacrifício pessoal, a abnegação levada ao extrem o.

O prim eiro a falar foi o soldado que sabia m uito de lobos, A tua história é bonita, disse para subhro, e essa vaca m erecia, pelo m enos, um a m edalha ao valor e ao m érito, m as há no relato algum as coisas pouco claras e até m esm o bastante duvidosas, Por exem plo, perguntou o cornaca em tom de quem j á se preparava para a luta, Por exem plo, quem te contou esse caso, Um galego, E com o o conheceu ele, Deve tê-lo ouvido a alguém , Ou lido, Não creio que saiba ler,

Ouviu-o e decorou-o, Pode ser, eu contentei-m e com repeti-lo o m elhor que pude, Tens boa retentiva, tanto m ais que a história vem contada num a linguagem nada corrente, Obrigado, disse subhro, m as agora gostaria de saber que coisas pouco claras e bastante duvidosas encontras tu no relato, A prim eira é o facto de se dar a entender, ou m elhor, é claram ente afirm ado que a luta entre a vaca e os lobos durou doze dias e doze noites, o que significaria que os lobos atacaram a vaca logo na prim eira noite e se retiraram , provavelm ente com baixas, na últim a, Não estávam os lá, não pudem os ver, Sim , m as os que conhecem algum a coisa sobre lobos sabem que esses anim ais, em bora vivam em alcateia, caçam sozinhos, Aonde queres tu chegar, perguntou subhro, Quero chegar a que a vaca não poderia resistir a um ataque concertado de três ou quatro lobos, j á não digo doze dias, m as um a única hora, Então, na história da vaca lutadora é tudo m entira, Não, m entira são só os exageros, os arrebiques de linguagem , as m eias verdades que querem passar por verdades inteiras, Que crês tu então que se passou, perguntou subhro, Creio que a vaca realm ente se perdeu, que foi atacada por um lobo, que lutou com ele e o obrigou a fugir talvez m al ferido, e depois se deixou ficar por ali pastando e dando de m am ar ao vitelo, até ser encontrada, E não pode ter sucedido que viesse outro lobo, Sim , m as isso j á seria m uito im aginar, para j ustificar a m edalha ao valor e ao m érito um lobo j á é bastante. A assistência aplaudiu pensando que, bem vistas as coisas, a vaca galega m erecia a verdade tanto com o a m edalha.

Reunida à prim eira hora da m anhã, a assem bleia geral dos carregadores decidiu, sem votos contra, que o regresso a lisboa se haveria de com eter por rotas m enos duras e perigosas que as da vinda, por cam inhos m ais afáveis e m acios de piso e sem tem er as m iradas am arelas dos lobos e os sinuosos rodeios com que, pouco a pouco, vão acurralando os cérebros das suas vítim as. Não é que os lobos não apareçam nas regiões da costa do m ar, pelo contrário, aparecem , e m uito, e fazem grandes razias nos rebanhos, m as há um a diferença enorm e entre cam inhar entre penhascos que só de os olhar o coração estrem ece e pisar a areia fresca das praias de pescadores, gente boa sem pre capaz de abrir m ão de m eia dúzia de sardinhas em pago de um a aj uda, m esm o que apenas sim bólica, ao arraste do barco. Os carregadores j á têm os seus farnéis e agora esperam que venham subhro e o elefante para as despedidas. Alguém teve a ideia, seguram ente o próprio cornaca. E não se sabe com o ela lhe terá surgido, um a vez que não há nada escrito sobre o assunto. Um a pessoa pode ser abraçada por um elefante, m as não há m aneira nenhum a de im aginar o gesto contrário correspondente. E quanto aos apertos de m ão, esses, seriam sim plesm ente im possíveis, cinco insignificantes dedos hum anos j am ais poderão abarcar um a patorra grossa com o um tronco de árvore. Subhro m andara-os form ar em linha dupla, quinze à frente e quinze atrás, deixando a distância de um côvado entre cada dois hom ens, o que indicava com o provável que o elefante não teria que fazer m ais que desfilar diante deles com o se estivesse a passar revista à tropa. Subhro tom ou outra vez a palavra para dizer que cada hom em , quando salom ão parasse na sua frente, deveria estender a m ão direita, com a palm a para cim a, e esperar a despedida. E não tenham m edo, salom ão está triste, m as não está zangado, tinha-se habituado a vocês e agora descobriu que se vão em bora, E com o o soube ele, Essa é um a daquelas coisas que nem vale a pena perguntar, se o interrogássem os diretam ente, o m ais certo seria não nos responder, Por não saber ou por não querer, Creio que na cabeça de salom ão o não querer e o não saber se confundem num a grande interrogação sobre o m undo em que o puseram a viver, aliás, penso que nessa interrogação nos encontram os todos, nós e os elefantes. Im ediatam ente, subhro pensou que tinha acabado de proferir um a frase estúpida, daquelas que poderiam ocupar um lugar de honra na lista dos narizes de cera, Felizm ente que ninguém m e entendeu, m urm urou enquanto se afastava para trazer o elefante, um a boa coisa que a ignorância tem é defender-nos dos falsos saberes. Cá fora os hom ens im pacientavam -se, não viam a hora de se porem a cam inho, iriam ao longo da m argem esquerda do rio douro para m aior segurança, até chegarem à cidade do porto, que tinha reputação de receber bem as pessoas e onde alguns, desde que se resolvesse a questão da cobrança do salário, o que só em lisboa poderia ser feito, j á pensavam em estabelecer-se. Estava-se nisto, cada qual com os seus pensam entos, quando salom ão apareceu, m ovendo pesadam ente as suas quatro toneladas de carne e ossos e os seus três m etros de altura. Alguns hom ens m enos afoitos sentiram um aperto na boca do estôm ago só de im aginarem que algum a coisa poderia correr m al nesta despedida, assunto, o das despedidas entre espécies anim ais diferentes, sobre o qual, com o dissem os, não existe bibliografia. Acolitado pelos seus auxiliares, a quem não falta m uito para que se lhes acabe

o dolce far niente em que têm vivido desde que saíram de lisboa, subhro vem sentado no am plo cachaço de salom ão, o que só serviu para aum entar o desassossego dos hom ens alinhados. A pergunta estava em todas as cabeças, Com o poderá ele acudir-nos se está lá tão alto. As duas filas oscilaram um a e outra vez, parecia que haviam sido sacudidas por um vento fortíssim o, m as os carregadores não se dispersaram . Aliás, seria inútil porque o elefante j á se aproxim ava.

Subhro fê-lo deter-se diante do hom em que se encontrava no extrem o direito da prim eira fila e disse em voz clara, A m ão estendida, a palm a para cim a. O hom em fez o que lhe ordenavam , a m ão ali estava, firm e na aparência. Então o elefante pousou sobre a m ão aberta a extrem idade da trom ba e o hom em respondeu ao gesto instintivam ente, apertando-a com o se fosse a m ão de um a pessoa, ao m esm o tem po que tentava dom inar a contração que se lhe estava a form ar na garganta e que poderia, se deixada à solta, term inar em lágrim as. Trem ia dos pés à cabeça, enquanto subhro, lá de cim a, o olhava com sim patia. Com o hom em ao lado repetiu-se m ais ou m enos a m ím ica, m as houve tam bém um caso de rej eição m útua, nem o hom em quis estender o braço nem o elefante avançou a trom ba, um a espécie de antipatia fulm inante, instintiva, que ninguém saberia explicar, um a vez que durante a viagem nada se passara entre os dois que pudesse anunciar sem elhante hostilidade. Em com pensação, houve m om entos de vivíssim a em oção, com o foi o caso daquele hom em que explodiu num choro convulsivo com o se tivesse reencontrado um ser querido de quem havia m uitos anos não tinha notícias. A este tratou-o o elefante com particular com placência. Passou-lhe a trom ba pelos om bros e pela cabeça em carícias que quase pareciam hum anas, tal eram a suavidade e a ternura que delas se desprendiam no m enor m ovim ento. Pela prim eira vez na história da hum anidade, um anim al despediu-se, em sentido próprio, de alguns seres hum anos com o se lhes devesse am izade e respeito, o que os preceitos m orais dos nossos códigos de com portam ento estão longe de confirm ar, m as que talvez se encontrem inscritos em letras de ouro nas leis fundam entais da espécie elefantina. Um a leitura com parativa dos docum entos de am bas as partes seria certam ente bastante elucidativa e talvez nos aj udasse a com preender a reação negativa m útua que, m uito a nosso pesar, por am or da verdade, tivem os de descrever acim a. No fundo, talvez os hom ens e os elefantes não cheguem a entender-se nunca. Salom ão acaba de soltar um barrito que deverá ter sido escutado num a légua ao redor de figueira de castelo rodrigo, não um a légua das nossas, m as das outras, m ais antigas e bastante m ais curtas. Os m otivos e as intenções do berro estridente que lhe irrom peu dos pulm ões não são facilm ente decifráveis por pessoas com o nós, que de elefantes sabem os tão pouco. E se a subhro fôssem os perguntar o que, na sua qualidade de perito, pensa sobre o assunto, o m ais certo seria não querer com prom eter-se dando-nos um a resposta evasiva, daquelas que fecham a porta a qualquer outro intento. Não obstante as incertezas, sem pre presentes quando se falam idiom as diferentes, parece j ustificado adm itir que o elefante salom ão tenha gostado da cerim ónia do adeus. Os carregadores j á se haviam posto em m archa. A convivência com os m ilitares tinha-os levado, quase sem darem por tal, a ganhar certos hábitos de disciplina com o aqueles que possam resultar da ordem de form atura, por exem plo, escolher entre organizar um a coluna de dois ou de três de fundo, porquanto não é o m esm o disporem -se trinta hom ens de um a m aneira ou da outra, no prim eiro caso a coluna teria quinze filas, um exagero de extensão facilm ente rom pível à m ais pequena com oção pessoal ou coletiva, ao que no segundo caso elas seriam reduzidas a um sólido bloco de dez, a que só faltariam os escudos para parecer a tartaruga rom ana. No entanto, a diferença é sobretudo

psicológica. Pensem os que estes hom ens têm pela frente um a longa m archa e que o natural é que, no decurso dela, vão conversando para entreter o tem po. Ora, dois hom ens que tenham de cam inhar j untos durante duas ou três horas seguidas, m esm o im aginando que sej a grande o desej o de com unicação, acabarão fatalm ente, m ais cedo ou m ais tarde, por cair em contrafeitos silêncios, quem sabe m esm o se odiar-se. Algum desses hom ens poderia não ser capaz de resistir à tentação de atirar o outro por um a ribanceira abaixo. Razão têm , portanto, as pessoas que dizem que três foi a conta que deus fez, a conta da paz, a conta da concórdia. Em três, ao m enos, um qualquer poderá estar calado durante alguns m inutos sem que se note dem asiado. O pior é se um deles que tenha andado a pensar em elim inar outro para lhe ficar com o farnel, por exem plo, convida o terceiro a colaborar na repreensiva ação, e este lhe responde, pesaroso, Não posso, j á estou com prom etido em aj udar a m atar-te a ti.

Ouviu-se o trote esfogueado de um cavalo. Era o com andante que vinha para despedir os carregadores e desej ar-lhes boa viagem , atenção que não se esperaria de um oficial do exército por reconhecidam ente bom que sej a o seu fundo m oral, m as que não seria vista com bons olhos pelos superiores, acérrim os defensores de um preceito velho com o a sé de braga, aquele que determ ina que terá de haver um lugar para cada coisa a fim de que cada coisa tenha o seu lugar e dele não saia. Com o princípio básico de um a eficaz arrum ação dom éstica, nada m ais louvável, m au é quando se pretenda distribuir a gente pelos cacifos da m esm a m aneira. O que parece m ais do que evidente é que os carregadores, no caso de se virem a concretizar as conspirações de assassínio que germ inam em algum as daquelas cabeças, não m erecem estas delicadezas.

Deixem o-los portanto entregues à sua sorte e vej am os que quer aquele hom em que se aproxim a a toda a pressa apesar de, pela idade, j á não o aj udarem m uito as pernas. As ofegantes palavras que disse quando chegou ao alcance da voz foram estas, O senhor alcaide m anda avisar vossa senhoria de que o pom bo j á chegou. Afinal, sem pre era verdade, os pom bos-correios voltam a casa. A m orada do alcaide não era longe dali, m as o com andante lançou o cavalo a um a velocidade tal que era com o se pretendesse entrar em valladolid ainda antes da hora do alm oço.

Menos de cinco m inutos depois apeava-se à porta da m ansão, subia a escada a correr e ao prim eiro criado que encontrou pediu que o conduzisse ao alcaide. Não foi preciso ir procurá-lo porque ele j á vinha aí, trazendo na cara um ar de satisfação com o só se supõe que o tenham os am antes da colum bofilia perante os triunfos dos seus pupilos. Já chegou, j á chegou, venha com igo, dizia com entusiasm o. Saíram para um a am pla varanda coberta onde um a enorm e gaiola de cana ocupava boa parte da parede a que estava fixada. Ali está o herói, disse o alcaide.

O pom bo ainda tinha a m ensagem atada à pata, situação que o proprietário achou conveniente esclarecer, Em geral, retiro a m ensagem logo que o pom bo pousa e faço-o porque não quero que com ece a dar o trabalho por m al em pregado, m as neste caso preferi esperar a sua chegada para lhe dar a si um a satisfação com pleta, Não sei com o lho agradeça, senhor alcaide, creia que este é para m im um dia grande, Não duvido, com andante, nem tudo na vida são alabardas, alabardas, espingardas, espingardas. O alcaide abriu a porta da gaiola, introduziu o braço e agarrou o pom bo, que não resistiu nem tentou escapar, com o se j á antes tivesse estranhado que não lhe dessem atenção. Com m ovim entos rápidos m as cuidadosos o alcaide desfez os nós, desenrolou a m ensagem , um a estreita tira de papel que devia ter sido cortada assim para não entorpecer os m ovim entos da ave. Em frases breves, o esculca inform ava que os soldados eram couraceiros,

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