Cecília teve pena do seu embaraço.
— Vai buscar uma flor que tua senhora deitará nos seus cabelos, em vez deste bracelete que ela nunca deitará no seu braço.
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Estas últimas palavras foram ditas com um tom de energia, que revelava a firmeza do caráter desta menina; ela fechou outra vez o bracelete na caixa e ficou um momento melancólica e pensativa.
Peri voltou trazendo uma linda flor silvestre que encontrara no jardim; era uma parasita aveludada, de lindo escarlate. A menina prendeu a flor nos cabelos, satisfeita por ter cumprido um inocente desejo de Peri, que só vivia para cumprir os seus; e dirigiu-se ao quarto de sua prima, ocultando no seio a caixinha de veludo.
Isabel pretextara uma indisposição; não saíra do seu quarto depois que voltara do aposento de Cecília, tendo traído o segredo de seu amor.
As lágrimas que derramou não foram como as de sua prima, de alivio e consolo; foram lágrimas ardentes, que em vez de refrescarem o coração, o queimam como o rescaldo da paixão.
Às vezes, ainda umedecidos de pranto, seus olhos negros brilhavam com um fulgor extraordinário; parecia que um pensamento delirante passava rapidamente
no seu espírito desvairado. Então ajoelhava-se, e fazia uma oração, no meio da qual suas lágrimas vinham de novo orvalhar-lhe as faces.
Quando Cecília entrou, ela estava sentada à beira do leito, com os olhos fitos na janela, por entre a qual se via uma nesga do céu.
Estava bela da melancolia e languidez que prostrava o seu corpo num enlevo sedutor, fazendo realçar as linhas harmoniosas de seu talhe gracioso.
Cecília aproximou-se sem ser vista, e estalou um beijo na face morena de sua prima.
— Já te disse que não te quero ver triste.
— Cecília!... exclamou Isabel sobressaltando-se.
— Que é isto? Faço-te medo?
— Não... mas...
— Mas, o quê?
— Nada...
— Sei o que queres dizer, Isabel, julgaste que conservava uma queixa de ti.
Confessa!
— Julguei, disse a moca balbuciando, que me tinha tornado indigna de tua amizade.
— E por quê? Fizeste-me tu algum mal? Não somos nós duas irmãs, que nos devemos amar sempre?
— Cecília, o que tu dizes não é o que tu sentes! exclamou Isabel admirada.
— Algum dia te enganei? replicou Cecília magoada.
— Não; perdoa; porém é que...
A moça não continuou; o olhar terminou o seu pensamento, e exprimiu o espanto que lhe causava o procedimento de Cecília. Mas de repente uma idéia assaltou-lhe o espírito.
Cuidou que Cecília não tinha ciúmes dela, porque a julgava indigna de merecer um só olhar de Álvaro; esta lembrança a fez sorrir amargamente.
— Assim, está entendido, disse Cecília com volubilidade, nada se passou entre nós; não é verdade?
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— Tu o queres!
— Quero, sim; nada se passou; somos as mesmas, com uma diferença, acrescentou Cecília corando, que de hoje em diante tu não deves ter segredos para comigo.
— Segredos! Tinha um que já te pertence! murmurou Isabel.
— Porque o adivinhei! Não é assim que desejo; prefiro ouvir de tua boca; quero consolar-te quando estiveres toda tristezinha como agora, e rir-me contigo quando ficares contente. Sim?
— Ah! nunca! Não me peças uma coisa impossível, Cecília! Já sabes demais; não me obrigues a morrer a teus pés de vergonha.
— E por que te causaria isto vergonha? Assim como tu me amas, não podes amar uma outra pessoa?
Isabel escondeu o rosto nas mãos para disfarçar o rubor que subia-lhe às faces; Cecília um pouco comovida olhava sua prima e compreendia nesse momento a causa por que ela própria corava quando sentia os olhos de Álvaro fitos nos seus.
— Cecília, disse Isabel fazendo um esforço supremo, não me iludas, minha prima; tu és boa, tu me amas, e não queres magoar-me; mas não zombes da minha fraqueza. Se soubesses como sofro!
— Não te iludo, já te disse; não desejo que sofras, e menos que sofras por minha causa; entendes?
— Entendo, e juro-te que saberei fazer calar meu coração; se for preciso ele morrerá antes do que dar-te uma sombra de tristeza.
— Não, exclamou Cecília, tu não me compreendes: não é isto que eu te peço, bem ao contrário quero que... sejas feliz!