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Admirável mundo novo (1932), de Aldous Huxley;

1984 (1949), de George Orwell;

Farenheit 451 (1953), de Ray Bradbury;

Jogos Vorazes (2008), de Suzanne Collins.

Provavelmente o último é o mais conhecido entre os adolescentes.

Ao explorar esses exemplos, os estudantes talvez percebam que Ensaio so-13

bre a cegueira tem várias semelhanças com esses mundos distópicos, mas também diferenças. Contextualizar a obra tendo em vista seus pares literários relaciona-se com a seguinte habilidade da Base Nacional Comum Curricular (bncc):

(EM13LP01) relacionar o texto, tanto na produção como na leitura/

escuta, com suas condições de produção e seu contexto sócio-histórico de circulação (leitor/audiência previstos, objetivos, pontos de vista e perspectivas, papel social do autor, época, gênero do discurso etc.), de forma a ampliar as possibilidades de construção de sentidos e de análise crítica e produzir textos adequados a diferentes situações.

No contexto dessa comparação com outras obras, é comum as distopias terem uma ancoragem muito grande no mundo tecnológico, mas no caso do livro de Saramago ocorre o contrário: não há celulares, os relógios para nada servem e nem funcionam, mal se escuta falar sobre telefones e não há menções a computadores. É evidente que talvez não se percebam essas características logo de cara, muito menos antes da leitura, mas vale nessa aula de apresentação ao livro estimulá-los a terem em vista esse contexto da produção distópica durante a leitura. Além, claro, de retomar essa discussão depois.

E NS A IO PA R A O E NS A IO S OBR E A C EGU E IR A Como forma de sensibilizar os estudantes para o livro, propõe-se que se faça uma espécie de ensaio para o Ensaio sobre a cegueira. Em primeiro lugar, será uma boa oportunidade para indagar-se sobre o título, perguntar aos estudantes por que Saramago chama essa obra de ensaio. Será que esse livro está nos preparando para algo, fazendo-nos ensaiar? Ou será que o sentido se refere ao gênero textual ensaio? Vale a pena levantar uma série de hipóteses e voltar a elas no fim da leitura, de preferência anotá-las em algum cartaz que fique visível a todos ou em algum documento.

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A partir daí, pode-se perguntar o que os estudantes acreditam que fa-riam se ficassem privados de visão de uma hora para a outra. Nesse momento, é importante tomar cuidado com a discussão, sobretudo se houver algum deficiente visual entre os estudantes ou entre os familiares deles.

Sugere-se que primeiro eles pensem individualmente e depois discu-tam com a classe toda ou em grupos. Por fim, cabe anotar as respostas em um documento que fique guardado até o final da leitura, para que essas anotações possam ser retomadas ao longo da leitura.

Em seguida, pode-se instigá-los perguntando o que acham que acon-teceria com a humanidade se, repentinamente, ficássemos todos cegos. Cha-má-los para suposições é uma maneira de implicá-los na leitura, trazer suas subjetividades para o tema. Sem dúvida Saramago fará isso muito bem com suas palavras quando eles começarem a ler o romance, mas sempre é válida uma sensibilização para todo tipo de leitura escolar, já que não se trata de uma escolha — ler ou não esse livro. Leitura

LE IT U R A DO PRIM E IRO C A P Í T U LO

Recomenda-se a leitura integral do primeiro capítulo em sala, porque ele traz tematizações bastante importantes que reaparecerão ao longo da narrativa, comportando-se como um microcosmo do livro.

Tudo começa com o primeiro homem que cega. Ele está ao volante, parado no farol vermelho, esperando abrir, e então é acometido pela cegueira branca. Alguém tem de socorrê-lo e levá-lo para casa. O sujeito que o levou pergunta se ele quer companhia em sua casa, até que alguém chegue, porém ele dispensa o homem, com medo do que o homem pode fazer ali, sem que ele possa ver. O homem então vai embora e ele permanece esperando sua esposa.

Quando ela chega, o casal então decide procurar um médico. No momento em que se dirigem ao consultório, percebem que o tão solícito homem que o levou até em casa acabou por roubar-lhe o carro. O oftalmologista pelo qual passam terá um papel muito importante nessa história.

Apenas nesse breve capítulo, há uma série de elementos a serem te-15

matizados. Será necessário, provavelmente, escolher quais discussões serão desenvolvidas, e a seguir são sugeridas algumas questões emblemáticas: Vulnerabilidade do corpo e a necessidade do outro: Na vida que levamos, principalmente nos centros urbanos, dificilmente nos damos conta do quanto nosso corpo é vulnerável e fraco. Contamos com pessoas que, desde o nascimento, nos ajudam a viver mais e melhor. Há, muitas vezes, quem cozinhe nossa comida, nos ajude a ver melhor, nos ensine a ler e escrever, costure nossas roupas, cuide de nossas enfermidades etc. Da forma como essa interdependência está internalizada em nossa vida cotidia-na, nem nos damos conta do quanto dependemos do outro e do quanto as formações sociais nos são úteis. No primeiro capítulo de Ensaio sobre a cegueira, a partir do momento que o primeiro cego deixa de ver, instanta-neamente precisa de pessoas dotadas de visão para ajudar-lhe, e também precisará da mulher para levar-lhe ao médico, mesmo que essa visita não adiante nada. A vulnerabilidade do corpo e a dependência dos outros apa-recerá de modo muito forte do começo ao fim da narrativa, então cabe logo ressaltar essa dinâmica para ajudar os estudantes a continuarem a leitura sozinhos, se for o caso.

A vileza humana: Aproveitando-se da fraqueza alheia, o homem que ajudou o primeiro cego acaba roubando-lhe o carro... A ocasião, nesse caso, fez o ladrão. Ainda nesse capítulo não fica tão claro se ele de fato roubou o carro ou estacionou em qualquer lugar fora do alcance, mas no seguinte isso será esclarecido. Assim, é um momento bem interessante para tratar da ética e da moral humanas, discussão tão presente no livro. Será que de fato nós nos aproveitamos dos outros quando nos é dada a chance? Somos todos passí-veis de enganar, ou fazemos isso apenas por medo de sermos pegos? A visão de Saramago quanto a isso parece que vai ficando clara durante o romance: quando são trancados no manicômio desativado, muitos se aproveitam dos outros de maneira completamente maldosa, com requintes de sadismo. Veremos que há estupros, mortes e outros comportamentos terríveis por parte dos cegos em quarentena; no entanto, outros se mantêm fiéis a uma moral que subverte o contexto degradante no qual estão inseridos, como a mulher do médico, a protagonista do livro.

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Brancura da cegueira: Uma das características mais interessantes da cegueira desse romance é o fato de ser inexplicavelmente branca. Contra-riando nossas expectativas, o que esses cegos veem é um mar de leite. Não foi à toa que Saramago teria escolhido tal conformação. Desse modo, vale tematizar mais de uma vez essa característica. A clareza e a brancura se dão a ver na presença de luz, então, não é de todo estranho pensar nessa cegueira como um excesso de luz. Se considerarmos o que a iluminação ou a luz trazem em si de concepções e simbologias, podemos imaginar que esse excesso de luz possa também significar um excesso de razão. Tendo em vista a história mundial no século xx, é plausível que haja uma perspectiva, por parte de Saramago e expressa em sua obra, de que a razão possa se tornar tóxica, se for tomada como positivismo, por exemplo. Seja como for, é bastante importante nesse começo já perguntar aos estudantes o que eles têm a dizer sobre isso, se imaginam o motivo de essa cegueira ser branca. Tais especulações já os trarão para a dimensão alegórica da obra.

Aspectos formais: É possível, já nesse começo, perceber a presença de um narrador intruso, onisciente, que narra e também parece participar da narrativa. Além disso, percebe-se a pontuação típica de Saramago, com períodos longuíssimos e muitas vírgulas. Além, é claro, da forma inusitada como ele desenvolve os diálogos, com muita fluidez e poucos pontos finais.

Durante o desenrolar da narrativa será possível notar como isso influencia o texto de maneira mais clara, mas é importante destacar essas características no começo da leitura.

Essas são apenas algumas perspectivas sobre o livro, e o mais importante aqui é deixar os estudantes falarem, dizerem como veem esse primeiro capítulo, se percebem as temáticas elencadas e o que pensam sobre elas. Não é interessante confirmar ou negar nenhuma das hipóteses que eles tenham acerca do livro, pois a própria narrativa lhes apontará se as hipóteses se con-firmam, e dessa forma o professor deixa que eles mesmos cheguem a conclu-sões. Tampouco é preciso passar por todos esses pontos, pode-se priorizar os que aparecerem nas falas.

Tanto esse momento de leitura e discussão como os outros que ainda virão se relacionam à seguinte habilidade da bncc do Novo Ensino Médio: 17

(EM13LP46) Compartilhar sentidos construídos na leitura/escuta de textos literários, percebendo diferenças e eventuais tensões entre as formas pessoais e as coletivas de apreensão desses textos, para exercitar o diálogo cultural e aguçar a perspectiva crítica.

É fundamental, no processo de aprendizagem, proporcionar aos estudantes esses momentos de fala e escuta do outro, envolvendo inclusive as tensões que esse encontro com outras subjetividades pode proporcionar: Compartilhar as obras com outras pessoas é importante porque torna possível beneficiar-se da competência dos outros para construir o sentido e obter o prazer de entender mais e melhor os livros. Também porque permite experimentar a literatura em sua dimensão socializadora, fazendo com que a pessoa se sinta parte de uma comunidade de leitores com referências e cumplicidades mútuas. (COlOmer, 2007, p. 143)

DI Á RIO DE LE IT U R A

Ensaio sobre a cegueira é uma leitura longa e bastante densa, que deve mobilizar os estudantes não só pela inteligência de um enredo alegórico que expõe de maneira impressionante as entranhas da humanidade, mas também pela terrível violência que aparece em muitas das partes do livro. Assim, será preciso tematizar em sala as escolhas do autor, os efeitos de uma violência tão explícita na sua recepção e as estratégias de descrição; mas, para que isso ocorra, primeiro é necessário acolher e problematizar os sentimentos dos estudantes diante da obra, bem como suas reflexões. E isso deve ser feito não apenas para ajudá-los a encarar esse clássico da literatura, mas também porque os sentimentos e as sensações dos leitores não são elementos que devem ser ignorados na análise de um livro, pelo contrário, podem ajudar-nos em sala de aula a construir interpretações com base nas estratégias de recepção do autor.

Tendo em vista a necessidade de acompanhamento que esse livro im-põe, propõe-se durante a leitura uma forma de escrita que ajude os estu-18

dantes a relacionarem-se com o material: um diário de leitura. Para isso, o ideal é que eles tenham algum caderninho que possam usar apenas para essa finalidade, mas, se isso não for possível, podem separar uma parte do caderno de Língua Portuguesa, por exemplo.

A ideia de um diário de leitura gira em torno da liberdade de não precisar escrever o que se espera escolarmente de uma leitura. Os estudantes poderão escrever absolutamente tudo o que lhes ocorrer enquanto leem —

sejam desconfortos, análises interpretativas, relações com a própria vida, elementos que os desagradaram. É muito importante, então, que o professor se comprometa a não ler o que os estudantes estão escrevendo, justamente para que eles se sintam à vontade para expressar verdadeiramente o que pensam e sentem. Isso não significa, no entanto, que esse diário não será usado em sala de aula; pelo contrário, a ideia é que ele seja intensamente usado, mas que possa configurar um espaço privado de investimento subjetivo.

Trata-se de uma proposta livre, que não deve ser tão direcionada. A única obrigatoriedade é que, todos os dias em que lerem alguma parte do livro, os estudantes escrevam algo sobre o livro. É claro que, quanto mais organizados forem para gerenciar o próprio tempo, melhor será o resultado; então vale a pena dizer isso para as turmas como forma de ajudá-las. Eventualmente pode haver certa resistência por parte de alguns em relação à proposta, mas, nesse caso, pode ser interessante dizer que eles podem escrever inclusive sobre a própria resistência, sobre o que sentem e percebem em relação a isso.

A ideia é compartilhar em sala de aula o diário, voluntariamente.

Quanto mais momentos em sala de aula houver para esse compartilhamento, melhor. Claro que eles devem falar para a turma apenas o que se sentirem à vontade para dizer, e podem inclusive falar o que pensam sobre a escrita do diário, sem expor o conteúdo dele. Sugere-se, inclusive, pedir que se prepa-rem para compartilhar suas leituras, selecionando anteriormente trechos a serem apresentados, ou mesmo que reescrevam algumas partes das anotações para dividi-las com os outros.

Como sugestão, seguem algumas partes do livro selecionadas como momentos importantes para discussão coletiva. Estão separadas pelo núme-ro aproximado de páginas, pois os capítulos no livro não são numerados: 19

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