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Esta Juliana anda uma janota! Prospera a olhos vistos.

D. Felicidade, à noite, também notou:

Que chique! Nem uma criada do paço!

Coitada! Coisas que ela aproveita. .

Prosperava, com efeito! Não punha na cama senão lençóis de linho.

Reclamara colchões novos, um tapete para os pés da cama, felpudo! Os sachês que perfumavam a roupa de Luísa iam passando para a dobra das suas

calcinhas. Tinha cortinas de cassa na janela, apanhadas com velhas fitas de seda azul; e sobre a cómoda dois vasos da Vista Alegre dourados! Enfim um dia santo, em lugar da cuia de retrós, apareceu com um chignon de cabelos!

Joana pasmava daquelas tafularias. Atribuía-as à bondade da senhora, e ressentia-se de ser "esquecida". Um dia mesmo, que Juliana estreara uma sombrinha, disse diante de Luísa, com uma voz de despeito:

Para umas tudo, para outras nada!. .

Luísa riu, acudiu:

Tolices! Eu sou a mesma pra todas.

Mas refletiu: Joana podia ter desconfianças também, ter ouvido alguma coisa a Juliana... E logo ao outro dia, para a conservar contente e amiga, deu-lhe dois lenços de seda, depois dois mil réis para um vestido; e daí por diante nunca lhe recusou licença para sair à noitinha à casa de uma tia. .

A Joana ia por toda a parte falando da senhora, que era um anjo. Na rua, de resto, tinha-se notado o luxo de Juliana. Sabia-se do "quarto novo", dizia-se baixo que tinha alcatifa! O Paula decidira, com indignação, que ali positivamente havia marosca.

Mas Juliana uma tarde, diante do Paula e da estanqueira, explicou, acalmou as suspeitas.

Ora! Dizem que tenho isto e aquilo. Não é tanto! Tenho as minhas comodidades. Mas também a maneira como eu lhes tratei a tia, de dia e de noite, sem arredar pé. . Por mais que façam não me pagam, que arruinei a minha saúde!

Assim se justificou a prosperidade de Juliana. Era a família agradecida, dizia-se; tratavam-na como parenta!

E, pouco a pouco, a casa do Engenheiro teve para os criados da vizinhança a vaga sedução de um paraíso; dizia-se que as soldadas eram enormes, havia vinho à discrição, recebiam-se presentes todas as semanas, ceava-se todas as noites caldo de galinha! Cada um invejava aquela "pechincha". Pela inculcadeira, a fama da casa do Engenheiro alargou-se. Criou-se uma legenda.

Jorge, atónito, recebia todos os dias cartas de pessoas oferecendo-se para criados de quarto, criadas de dentro, cozinheiros, escudeiros, governantas, cocheiros, guarda-portões, ajudantes de cozinha.. Citavam as casas titulares de que tinham saído; pediam audiência; suspeitando certas coisas uma bonita criada de quarto juntou a sua fotografia; um cozinheiro trouxe uma carta de empenho do diretor-geral do ministério.

Estranho caso! — dizia Jorge, pasmado — disputam-se a honra de me servir! Imaginarão que me saiu a sorte grande?

Mas não dava muita atenção àquela singularidade. Vivia então muito ocupado; andava escrevendo o seu relatório; e todos os dias saía ao meio-dia, voltava às

seis com rolos de papéis, mapas, brochuras, fatigado, berrando pelo jantar, radiante.

Contou o caso, todavia, rindo, um domingo à noite. O Conselheiro observou logo.

Com o bom génio de D. Luísa, com o seu, Jorge, neste bairro saudável, numa casa sem escândalos, sem questões de família, toda virtude, é natural que a criadagem menos favorecida aspire a uma posição tão agradável.

Somos os amos ideais! — disse Jorge, batendo muito alegre no ombro.

A casa, com efeito, tornava-se agradável. Juliana exigira que o jantar fosse mais largo (para ter uma parte sua, sem sobejos), e como era boa cozinheira, vigiava os fogões, provava, ensinava pratos à Joana.

Esta Joana é uma revelação — dizia Jorge — vê-se-lhe crescer o talento.

Juliana, bem alojada, bem alimentada, com roupa fina sobre a pele, colchões macios, saboreava a vida; o seu temperamento adoçara-se naquelas abundâncias; depois, bem aconselhada pela tia Vitória, fazia o seu serviço com um zelo minucioso e hábil. Os vestidos de Luísa andavam cuidados como relíquias. Nunca os peitilhos de Jorge tinham resplandecido tanto! O sol de Outubro alegrava a casa, muito asseada, de uma pacatez de abadia. Até o gato engordava.

E no meio daquela prosperidade — Luísa definhava-se. Até onde iria a tirania de Juliana? Era agora o seu terror. E como a odiava! Seguia-a por vezes com um olhar tão intensamente rancoroso, que receava que ela se voltasse subitamente, como ferida pelas costas. E via-a satisfeita, cantarolando a Carta Adorada, dormindo em colchões tão bons como os seus, pavoneando-se na sua roupa, reinando na sua casa! Era justo, justos céus?

Às vezes vinha-lhe uma revolta, torcia os braços, blasfemava, debatia-se na sua desgraça, como nas malhas de uma rede; mas, não encontrando nenhuma solução, recaía numa melancolia áspera — em que o seu génio se pervertia.

Seguia com satisfação a amarelidão crescente das feições de Juliana; tinha esperanças no aneurisma: não rebentaria um dia, o demónio?

E diante de Jorge tinha de a elogiar!

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