Luísa olhou em roda, como se um raio tivesse atravessado o quarto; mas tudo estava imóvel e correto; nem uma prega das cortinas se movera, e os dois pastorinhos de porcelana sobre o toucador sorriam pretensiosamente.
Então tirou o roupão violentamente, passou um vestido sem apertar o corpete, vestiu por cima um casaco largo de inverno, atirou o chapéu para a cabeça despenteada, saiu, desceu a rua tropeçando nas saias, quase a correr.
O Paula saltou para o meio da rua para a seguir; viu-a parar à porta de Sebastião, e veio dizer à estanqueira:
—
Em casa do Engenheiro há novidade!
E ficou plantado à porta com os olhos cravados para as janelas abertas, onde as bambinelas de repes verdes caiam com as suas pregas imóveis.
—
O Sr. Sebastião? — perguntava Luísa à rapariguita sardenta, que correra a abrir a porta.
E ia entrando pelo corredor.
—
Na sala — disse a pequena.
Luísa subiu; sentia sons de piano; abriu violentamente a porta e correndo para ele, apertando as mãos contra o peito, numa voz angustiosa e sumida:
—
Sebastião, escrevi uma carta a um homem, a Juliana apanhou-ma. Estou perdida!
Ele ergueu-se devagar, assombrado, muito branco; viu-lhe o rosto manchado, o chapéu malposto, a aflição do olhar.
—
Que é? Que é?
—
Escrevi ao meu primo — repetiu, com os olhos cravados nele, ansiosamente — a mulher apanhou-me a carta... Estou perdida!
Fez-se muito pálida, os olhos cerraram-se-lhe.
Sebastião amparou-a, levou-a meio desmaiada para o sofá de damasco amarelo. E ficou de pé, mais descorado que ela, com as mãos nos bolsos do seu jaquetão azul, imóvel, estúpido.
De repente correu fora, trouxe um copo de água, borrifou-lhe o rosto ao acaso. Ela abriu os olhos, as suas mãos errantes apalparam em redor, fitou-o espantada, e deixando-se cair sobre o braço do canapé, com o rosto escondido nas mãos, rompeu num choro histérico.
O seu chapéu caíra. Sebastião apanhou-o, sacudiu-lhe delicadamente as flores, pô-lo sobre a jardineira com cuidado; e vindo nas pontas dos pés debruçar-se junto dela:
—
Então! Então! — murmurava. E as suas mãos, tocando-lhe de leve o braço, tremiam como folhas.
Quis dar-lhe água para a sossegar: ela recusou com a mão, endireitou-se devagar no sofá, limpando os olhos, assoando-se com grandes soluços.
—
Desculpe, Sebastião, desculpe — dizia. Bebeu então um gole de água, ficou com as mãos no regaço, quebrada; e, uma a uma, as suas lágrimas silenciosas caíam sem cessar.
Sebastião foi fechar a porta — e vindo ao pé dela com muita doçura:
—
Mas então? Que foi?
Ela ergueu para ele a sua face chorosa, onde os olhos brilhavam febrilmente, olhou-o um momento, e deixando pender a cabeça, toda humilhada:
—
Uma desgraça, Sebastião, uma vergonha! — murmurou.
—
Não se aflija! Não se aflija!
Sentou-se ao pé dela, e baixo, com solenidade:
—
Tudo o que eu puder, tudo o que for necessário, aqui me tem!
—