Falava delas, devagar, traçando a perna; o seu amigo, o patriarca de Jerusalém, a sua velha amiga, a Princesa de La Tour d'Auvergne! Mas o melhor do dia era de tarde — dizia — no Jardim das Oliveiras, vendo em frente as muralhas do Templo de Salomão, ao pé a aldeia escura de Betânia onde Marta fiava aos pés de Jesus, e mais longe, faiscando imóvel sob o sol, o Mar Morto! E ali passava sentado num banco, fumando tranquilamente o seu cachimbo!
Se tinha corrido perigos?
Decerto. Uma tempestade de areia no deserto de Petra! Horrível! Mas que linda viagem, as caravanas, os acampamentos! Descreveu a sua toilete, uma manta de pele de camelo às listras vermelhas e pretas, um punhal de Damasco numa cinta de Bagdá, e a lança comprida dos beduínos.
—
Devia-te ficar bem!
—
Muito bem. Tenho fotografias.
Prometeu dar-lhe uma, e acrescentou:
—
Sabes que te trago presentes?
—
Trazes? — E os seus olhos brilhavam.
O melhor era um rosário. .
—
Um rosário?
—
Uma relíquia! Foi benzido primeiro pelo patriarca de Jerusalém sobre o túmulo de Cristo, depois pelo papa. .
Ah! Porque tinha estado com o papa! Um velhinho muito asseado, já todo branquinho, vestido de branco, muito amável!
—
Tu dantes não eras muito devota — disse.
—
Não, não sou muito caturra nessas coisas — respondeu rindo.
—
Lembras-te da capela da nossa casa em Almada?
Tinham passado ali lindas tardes! Ao pé da velha capela morgada havia um adro todo cheio de altas ervas floridas — e as papoulas, quando vinha a aragem, agitavam-se como asas vermelhas de borboletas pousadas. .
—
E a tília, lembras-te, onde eu fazia ginástica?
—
Não falemos no que lá vai!
Em que queria ela então que ele falasse? Era a sua mocidade, o melhor que tivera na vida. .
Ela sorriu, perguntou:
—
E no Brasil?
Um horror! Até fizera a corte a uma mulata.
—
E porque te não casaste?... Estava a mangar! Uma mulata!
—
E de resto — acrescentou com a voz de um arrependimento triste —, já que me não casei quando devia — encolheu os ombros melancolicamente
—, acabou-se. . Perdi a vez. Ficarei solteiro.
Luísa fez-se escarlate. Houve um silêncio.