—
Além de amanhã termina a campanha,
P-o-o-or aqui se diz..
Se tal for verdade, se não for patranha...
E com um espremido enfático:
—
Se-e-rei bem feliz!
Ao outro dia, pelas duas horas da tarde, Sebastião e Julião passeavam em São Pedro de Alcântara.
Sebastião estivera contando a sua cena com Luísa, e como desde então a sua estima por ela crescera. Ao princípio escabreara-se, sim..
—
Mas teve razão! Assim de surpresa, ouvir uma daquelas! E eu levei a coisa mal, fui muito à bruta. .
Depois, coitadinha, concordara logo, mostra-se muito desgostosa, toda zelosa do seu pudor, pedira-lhe conselhos... Até tinha as lágrimas nos olhos.
—
Eu disse-lhe logo que o melhor era falar ao primo, dizer o que se passava. . Que te parece?
—
Sim — disse vagamente Julião.
Tinha-o escutado distraído, chupando a ponta do cigarro. O seu rosto térreo cavava-se, com uma cor mais biliosa.
—
Então achas que fiz bem, hem?
E depois de uma pausa:
—
Que ela é uma senhora de bem às direitas! As direitas, Julião!
Continuaram calados. O dia estava encoberto e abafado, com um ar de trovoada; grossas nuvens pesadas e pardas iam-se acumulando, enegrecendo
para o lado da Graça por trás das colinas; um vento rasteiro passava por vezes, pondo um arrepio nas folhas das árvores.
—
De maneira que agora estou descansado — resumiu Sebastião. — Não te parece?
Julião encolheu os ombros com um sorriso triste:
—
Quem me dera os teus cuidados, homem! — disse.
E falou então com amargura nas suas preocupações. — Havia uma semana que se abrira concurso para uma cadeira de substituto na Escola, e preparava-se para ele. Era a sua tábua de salvação, dizia; se apanhasse a cadeira, ganhava logo nome, a clientela podia vir, e a fortuna. . E, que diabo, sempre era estar de dentro!. . Mas a certeza da sua superioridade não o tranquilizava — porque enfim em Portugal, não é verdade? Nestas questões a ciência, o estudo, o talento são uma história; o principal são os padrinhos! Ele não os tinha — e o seu concorrente, um sensaborão, era sobrinho de um diretor-geral, tinha parentes na Câmara; era um colosso! Por isso ele trabalhava a valer, mas parecia-lhe indispensável meter também as suas cunhas! Mas quem?
—
Tu não conheces ninguém, Sebastião?. .
Sebastião lembrava-se de um primo seu, deputado pelo Alentejo, um gordo da maioria, um pouco fanhoso. Se Julião queria, falava-lhe.. Mas sempre ouvira
dizer que a Escola não era gente de empenhos e de intriga. . De resto tinham o Conselheiro Acácio...
—
Uma besta! — fez Julião. — Um parlapatão. Quem faz lá caso daquilo?
O teu primo, hem! O teu primo parece-me bom! E necessário alguém que fale, trabalhe.. — Porque acreditava muito nas influências dos empenhos, no domínio dos "personagens", nas docilidades da fortuna quando dirigida pelas habilidades da intriga. E com um orgulho raiado de ameaça: — Que eu hei de lhes mostrar o que é saber as coisas, Sebastião!
Ia explicar-lhe o assunto da tese, mas Sebastião interrompeu-o:
—
Ela aí vem.