- Pois bem, basta; mas eu vejo que vossa face está umedecida; seria uma lágrima se o relento da noite não molhasse também a rosa. Quereis descansar, sem dúvida; poderei gozar o prazer de conduzir-vos até à porta da gruta?...
- Sim, senhor.
Duas guerreiras tinham sido batidas; só a curiosidade retinha as outras: Augusto se chegou para elas e falou a D. Clementina:
- Agora nós, senhora.
Ela deixou-se levar pela mão até junto da fonte, e o estudante começou:
- Quereis fatos de anteontem ou da noite passada, senhora?
- Eu não entendo o que o senhor quer dizer.
- Pergunto, senhora, se vos dá gosto que eu vos repita o que convosco se passou, quando tomáveis um sorvete ao lado de um jovem de cabelos negros... o que convosco conversou o meu colega Filipe, quando tomáveis chá?
- Eu não preciso saber nada disso.
- Então dir-vos-ei o que mais vos interessa, sossegarei mesmo os vossos cuidados e os do Sr.
Filipe, a respeito da perda de certo objeto...
- Sr. Augusto!...
- Senhora, foi a fada desta misteriosa fonte quem vos roubou um precioso embrulho que continha uma trança de vossos cabelos e que deveria ser achado embaixo da quarta roseira da rua que vai ter ao caramanchão, e essa trança pára, hoje, em minhas mãos, ei-la aqui...
- Oh! dê-ma.
- Não preferis antes que eu a entregue ao feliz para quem a destináveis?
- Não, eu lhe peço que ma dê.
- Eu estou pronto a obedecer-vos, senhora, mas só na hora de minha partida. Vós quatro queríeis zombar de mim; não concebo até onde iria a vossa vingança; preciso de reféns que assegurem a paz entre nós; estes são meus; quereis saber mais alguma coisa?
- Eu já sei que o senhor sabe demais!
- Então...
- Quer, como as duas primeiras, oferecer-me a mão e obrigar-me a desamparar o campo?
- Venceu, senhor, e sou eu que lhe peço que me acompanhe até à porta da gruta.
- Eu estou pronto, senhoras, para servir-vo em tudo.
Só restava D. Joaninha, era a vez dela.
- Eu vos deixei para o fim, disse Augusto, porque a vós é que eu mais admiro, porque vós sois exatamente a única dentre elas que tem amado melhor e que mais infeliz tem sido, eu vos explicarei isto. Sois, todavia, um pouco excessiva em exigências...
- Que quer dizer, Sr. Augusto?
- Que quereis muito, quando ordenais a um estudante que vos escreva quatro vezes por semana, pelo menos; que passe por defronte de vossa casa quatro vezes por dia; que vá a miúdo ao teatro e aos bailes que freqüentais, e até que não fume charutos de Havana nem de Manilha, por ser falta de patriotismo.
- Quem lhe disse isso, senhor!?
- A fada, senhora, que sabe que amais a um moço, a quem dais a honra de chamar querido primo.
- É uma vil traição!
- Exatamente diz o mesmo a nossa boa fada, e ainda mais, senhora: quer que eu vos aconselhe a que desprezeis esse jovem infiel, que não sabe pagar o vosso amor: eu poderia dar-vos provas...
- Não as tenho eu bastante, exclamou D. Joaninha com sentimento, quando lhe ouço repetir o que deveria ser sabido dele e de mim somente?
Augusto ia falar; ela o interrompeu.
- Senhor, eu agradeço o benefício que recebi; o senhor quis zombar de mim, como das outras,
mas não o fez; ao contrário, atalhou em princípio uma grande enfermidade, que, talvez, fosse daqui a pouco tempo incurável! Eu galanteio também às vezes, porém, sei amar até o extremo. Adeus, senhor!
eu posso apenas agradecer-lhe, dizendo que tenho tanta confiança na sua discrição e no seu caráter, que nem mesmo lhe recomendo o cuidado do meu segredo.
D. Joaninha ia deixar a gruta; Augusto lhe ofereceu o braço.
- Agradecida, disse ela; permita que eu entre só em casa.
Augusto ficou só. Esteve alguns momentos lembrando-se da cena que acabava de ter lugar; finalmente disse, soltando uma risada:
- Vieram buscar lã e saíram tosquiadas!
E já estava para pôr o pé fora da gruta, quando uma voz branda e sonora o suspendeu, dizendo: